terça-feira, 7 de outubro de 2008

c'EST LA VIE


C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não ouviu
“Uma canção bonita falando da vida em ré maior”

C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não sorriu
Do “penso logo existo”, da besteira maior

C’est l avie ih

Que a vida é um bquadro sustenido em tom menor

C’est la vie
Que a vida é vã filosofia e viver é bem melhor

O mundo é um mapa de outro mundo
O mapa é o mundo

A vida é a história de outra vida
A vida é um mundo


Diante de um abismo tão profundo

Eterno segundo
Em frente seguir só livre pra sempre


Pra arder a mente

A árvore é já semente


C’est l avie

Que a vida é um bquadro sustenido em tom menor


C’est la vie
Que a vida é vã filosofia e viver é bem melhor
C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não ouviu
“Uma canção bonita falando da vida em ré maior”


C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não sorriu
Do “penso logo existo”, da besteira maior
letra: Wilson e Márcia

sábado, 20 de setembro de 2008

domingo, 24 de agosto de 2008

Dois atos...


Dois atos sempre me interessaram mais. O ato sexual e o ato cinematográfico. Os dois, pois direta ou indiretamente me colocam como agente do ato, me colocam lançado sobre uma situação, um movimento que motiva, multiplica, metamorfoseia. O primeiro que abre as portas das percepções mais recônditas. O segundo, pois produz minhas realidades. Qual bom sexo não coloca você em contato próximo com o que há de mais próximo do Eu? Qual bom filme não se conecta e algum momento com sua vida? E quando penso aqui no ato cinematográfico me refiro ao ato que resume o discurso artístico. Quando penso no sexo, falo do sexo. Sim, se trata ainda do discurso. No fundo são o discurso amoroso e o discurso do audiovisual que me encantam.
Hoje (algum tempo atrás) pareci encontrar no discurso religioso um ato que me interessou. O eterno retorno do discurso religioso, da vigília sobre si próprio. Não o fato de a missa ser para mim como desejava meu pai, meu bom pai. Não o fato de ter participado da homilia lendo a carta aos hebreus no seu momento mais de-cisivo. A escolha de Abraão que eu tinha lido através do Kierkegaard e não através da bíblia. Leituras... Mas algo que fazia atuar e algo que em mim através do discurso me encantava. Talvez pelo padre ser extremamente sedutor, talvez por estar conectado aos meus estudos - era uma missa em ação de graças devido ao término do mestrado. Ao menos meu pai gostaria que assim o fosse. McLuhan era profundamente religioso, A igreja, certamente não, a prece, sim para ele devia ser o meio.
Não adianta, igreja é o local das culpas. Ali a culpa dos meus atos aparecia. Ali a culpa de pensar no filme de anteontem e no sexo com ela que ficara deitada em minha casa se tornava culpa. Culpa de só me interessar de fato por isso. Por dois atos. Em dois atos a peça da minha vida se dá. Pois o que não é sexo é cinema e às vezes até o sexo é cinema e o cinema é sexo. Ela me leva sempre para outro lugar. Sorrio.
A melhor motivação disso tudo, além de estar escrevendo novamente por mim e não pelos outros, é a idéia de descobrir mais sobre um terceiro ato. Que sempre soou como o grande discurso... E como temos medo dos grandes discursos nos apequenamos no ateísmo pequeno burguês ou no fervor de falar em nome das religiões...
Palavra da salvação. Quando salvação já é uma palavra... Vontade de rever o Evangelho do Pasolini...E o Dias de Nietzsche em Turim.... Vontade de dar um curso sobre cinema e religião... Vontade de invadir aquele quarto onde ela inda dorme e tirar o pecado do mundo...


Saudades do Pai. Mestre foi você que na simplicidade, no bom coração, na devoção não se ligava nos discursos. Agradecimentos muitos, ainda algumas culpas, dores, aflições... Angústia como a de Abraão.
Vejam Kinsey, aliás o filme de ontem ( ou de uns anos atrás)

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Um dia sem você ( Ao Daniel )




Um poeta sem poema
Um cozinheiro sem tempero
Um criador sem idéias
Um músico sem instrumento

Um balão sem ar
Um dia sem sol
Um chopp sem colar
Um filme besteirol

Um sentir sem tocar
Um despertar sem olhar
Essa banda sem rock
Um tiro sem morte
Um dia sem amar


Um violão sem corda
Um carro sem pneu
Uma sopa sem colher
Um rugido sem som

Um ano sem dezembro
Um banho sem chuveiro
Uma planta sem semente
Uma fada sem duende

Um aperto sem mão
Uma queda sem chão
Um anel sem dedo
Um sangue sem vermelho

Um beijo sem boca
Um jantar sem louça
Um quebrar sem consertar
Um grito sem berrar




Um café sem cigarro
Um namoro sem sarro
Um lixo sem saco
Um espaço sem vácuo

Um gole sem cachaça
Uma piada sem graça
Um livro sem final
Uma roupa sem varal

Um Garrincha sem mané
Uma arca sem noé
Uma criança sem pirraça
Um truco sem trapaça

Um natal sem noel
Um horizonte sem ceú
Um embrulho sem papel
(Uma) Pelada sem Daniel


Um receber sem dar
Um amor sem cuidar
Uma paixão sem amar
Um doce sem engordar

Uma doença sem dor
Um Arlequim sem Pierôt
Um Godard sem Truffaut
Uma pastilha sem sabor

Um recreio sem bola
Uma memória sem escola
Uma direita sem esquerda
Uma esquerda sem direita



letra: Mau / Wilson / Cacau / Graci

sexta-feira, 30 de maio de 2008

O significado de maio de 68

O que significa hoje, Maio de 1968? As efemérides em geral giram em torno de fatos concretos: uma batalha, uma mudança no mapa, uma descoberta, uma lei nova. Porém, Maio de 68 é uma efeméride múltipla, flexível, geograficamente diversificada e encaixada em processos políticos completamente diferentes e até opostos.
1968 começa antes e vai além de maio. É um processo e não um momento. Mesmo na França, os significados de Maio de 68 são variados: havia a revolta dos estudantes contra um sistema acadêmico burocratizado, havia a mágoa das esquerdas contra o presidente Charles de Gaulle pela violenta repressão na Argélia, havia um protesto dos cineastas contra o ministro da Cultura pela demissão de Henri Langlois da Cinemateca.
Nos Estados Unidos, a rebelião foi alavancada pela reação à guerra no Vietnã. Na Europa Oriental, o protesto à derrubada da Cortina de Ferro imposta pelo estalinismo. E no Brasil a rebelião visava a ditadura militar que, em quatro anos, já colocara dois presidentes no poder e ameaçava eternizar-se.
Em cima das rebeliões políticas encadeadas produziam-se contestações sociais, sexuais e culturais. Duas décadas depois do fim da Segunda Guerra Mundial e da falsa paz representada pela Guerra Fria, o mundo ocidental queria mudar.
1968 foi um gigantesco impulso para mudanças setorizadas. Hoje, 40 anos depois, as novas gerações não conseguem entender exatamente o que aconteceu, nem conseguem colocar-se diante das transformações que sobraram. É possível que o vulcão já esteja novamente em erupção e ainda não percebemos, é possível também que as conquistas de 1968 tornaram nosso sistema ainda mais rígido e inflexível.

Alberto Dines
Editorial do programa Observatório da Imprensa na TV, exibido em 27/5/2008

terça-feira, 27 de maio de 2008

Mostra 40 anos de maio de 68

26/05
10h - Os Sonhadores,
DIRETOR BernardoBertolucci
19h - Terra em Transe,
DIRETOR Glauber Rocha
27/05
12h - A sociedade doespetáculo,
DIRETOR Guy Debord
18h - A insustentável leveza do ser,
DIRETORPhilip Kaufman
28/05
12h - Teorema,
DIRETOR Pier PaoloPasolini
19h - Sympathy for the devil,
DIRETOR Jean-Luc Godard
29/05
12h - O Bandido da luz vermelha,
DIRETOR RogérioSganzerla
19h - Oliver,
DIRETOR Carol Reed
30/05
12h - Partner,
DIRETOR BernardoBertolucci
19h - Partner,
DIRETOR BernardoBertolucci
Algumas sessões serão seguidas de debate

terça-feira, 13 de maio de 2008

Bens de arquivo

Como já escancarado por aqui há um amor por aquivar. A noção de arquivo faz parte das mais variadas pesquisas que venho realizando. Não me recordo ao certo se em 85 ou 86 ganhei meu primeiro VHS. Era um modelo daqueles pesadões e me acompanhou durante parte da minha descoberta enquanto homem. Com aquele vídeo, e por que não dizer naquele vídeo, entrei em contato com o arquivo audiovisual responsável por parte de minhas reflexões, prazeres e angústias de outrora e da última hora. Ainda na mesma época a paixão pela música começava a surgir, também de forma arquivística. E também com a fita magnética dando o tom. Parte daqueles arquivos em k7 me levou aos livros. Aí a paixão arquivística caminhou. Sempre atenta aos excessos. Eram muitos livros na estante, muitas fitas na prateleira do Vídeoclube do Brasil em uma antiga casa que arquivou memórias e amigos que sumiram. Arquivar é filtrar. É permitir que o filtro seja também arquivo.

Os arquivos dispensavam muito método. Nem com meus próprios vídeos - que hoje em dia com os dvd's devem beirar os 2000 títulos - conseguia classificá-los. Eles me classificaram. Me classificavam e classificam até hoje. Sem perceber novamente me tomaram e pediram: Estude-nos. Pareciam dizer os arquivos. "O que sou eu do lado de cá", perguntavam as pinturas de Klee ... O que guardam em mim, o que guardam de mim? Perguntam os arquivos a memória.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Mal de arquivo



Foi naquela tarde num dia sem muita paz
A mente vagava e sorria pedindo mais
Pra não lembrar nada, além do sol e do mar.
Coisas que na memória a gente tende a guardar

Arquivar o que te faz sonhar
Registrar, pra não mais lembrar

Foi tarde da noite, num dia sem muito som
As horas passavam em busca de frases no tom
Livros sobre a mesa, fotos, quadros sem cor
Coisas que a música tende a compor

Arquivar o que te faz sonhar
Registrar, pra não mais lembrar


Ah! Foi de manhãzinha, lembramos então.
Um poema dizia “A memória é uma ilha de edição”
Ninguém duvidava soava tão bem
Aí alguém lembrou que esquecer faz tão bem

Arquivar o que te faz sonhar
Registrar, pra não mais lembrar

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Nietzsche em 2 tempos: Por Münch e por Dioniso


"O nosso conhecimento exterior da arte é, no fundo, absolutamente ilusório, porque ao possuirmos tal conhecimento, não nos sentimos unidos e identificados com esse princípio essencial que, criados único e espectador único desta comédia da arte reserva para si o prazer eterno. Só no ato da produção artística,e na medida em que se identifica com o artista primordial do mundo, é que o gênio poderá saber algo da essência eterna da arte: porque só então,como por milagre, se tornará semelhante à perturbadora figura lendária que tinha faculdade de voltar os olhos para se contemplar a si própria; o gênio será então objeto e sujeito ao mesmo tempo, será simultaneamente poeta, ator e espectador "

quinta-feira, 1 de maio de 2008

11:11


São 11 e 11 e tudo mudou
acordes não surgem com tanta facilidade
Escrevem por mim na terceira pessoa
Pedem que corra... Zelam por não ter moral

Além do bem, além do sal
Leio a cartilha do irracional
Pois de razão já estamos legal
E de tanta rima passei tão mal... Fui de mau a melhor

Lambe o bigode. Esquizo tu tá
Cheira teu corpo que os órgãos se foram
Morde o sinal fechado em tua casa
Anda de lado ...se move que para. Sempre concordei que pensar é andar. Andamento

Só não diga que certo tu és
Nem com quem andas nem de onde vens
Não jogue ainda seus dados, seus dardos não ferem
Nem olhe bem nos olhos de ninguém

São 11 e 11 e nada mudou
o curso do rio tem outra dificuldade
Oram por mim e por outra pessoa
Torcem que morra... Trazem seu enfermo portal

Aquém do zen, aquém do tao
Aqui e sempre tudo é passional
Pois sem razão festejo o banal
E de tanta festa perdi o sinal.... Fui da cama ao Laos.

Atira no pé;. Esquizo ta tu
Chuta o santo que os deuses se foram
Avança o sinal aberto na tua rua
Rouba o mendigo... Esfrega ( a lama e o caos) na cara


Só não diga que certo tu foi
Nem com quem andas nem de onde veio
Jogue agora seus dados, seus dardos me ferem
Olhe bem nos olhos desse alguém que te faz rir

domingo, 27 de abril de 2008

Cinema dos sonhos: A propósito do longa " Cidade dos Sonhos", de David Lynch


"No hay Banda!"

Cena 1- Cidade dos sonhos é um filme que definitivamente deve fazer a crítica cinematográfica se perguntar sobre a sua função. Se o cinema, como aponta Gilles Deleuze em seu ‘Conversações’, “não tem necessidade alguma da crítica para encher as salas nem para preencher sua função social”, Cidade dos sonhos pode atestar essa consideração. Ou mais, pode lançar um verdadeiro desafio a quem deseja refletir criticamente sobre o filme. Como interpretar o sonho da cidade construída por Lynch? Para se ler, para se interpretar uma cidade precisamos da invisibilidade. Calvino mapeou as cidades invisíveis. Lynch filmou-as. O nome do filme original “Mulholland drive” não remete a cidade, mas a estrada. O nome do filme em português é metáfora pura.
O filme que nasceu de um projeto inacabado acaba por fazer qualquer crítico ou curioso por cinema se perguntar sobre o seu sentido. Acaba por acabar com a crítica institucionalizada que invadiu o cinema. Uma metanarrativa sobre o cinema. O paroxismo da abstração. O choro da morte da atriz no clube Silêncio. Uma radiografia da indústria cultural. Uma ode a fenomenologia da percepção. Afirmações que, em vão, tentam dar razão ao universo onírico de Lynch. Razão? "Me chama razões..."

Plano 2- Histórias. Entender o filme da forma que quiser, recomenda a atriz Naomi Watts. De acordo com as histórias que se envolver. Sentir a história pode ser a constatação do movimento que nos propõe Lynch. Ao relacionar o cinema com a “epifania do sensível”, André Bazin evidencia a arte que desvela o lado profundo e oculto do mundo. Cidade dos sonhos parece comprovar esse despertar para uma arte que fala de fato a interpretação livre da emoção. e que o cinema de Lynch vem de longe tentando indicar.

Contra-plongé -Imagens. Escrever sobre as imagens desse filme é um desafio, tal como compreendê-lo. Além de planos belíssimos gostaria de destacar as imagens tremidas e borradas para evidenciar os sentimentos, e mais, para mostrar a confusão dos personagens no mundo dos sonhos, na cidade chamada cinema. O diretor logo na abertura do filme abusa do poder da imagem. A dança que dá início ao longa não mostra só talento do também coreógrafo Lynch, mas brinca com a imagem e suas nuances de tal forma que aponta caminhos para a compreensão do sonho que o diretor nos convida a experimentar. Compreender o cinema, através das imagens de Lynch é tentar compreender os desafios do imaginário nos dias de hoje.

Luz, câmera, ação -Sons. No hay banda, mas há um Roy Orbison, sempre. O Clube do silêncio é um clube de lágrimas. I will be crying... Se em "Veludo azul", Lynch já demonstrava sua reverência a um dos maiores da música pop, em “Cidade dos sonhos” isso é defintivo.

no hay espectador- O cinema dos sonhos que o filme nos apresenta simboliza a urgência de uma arte voltada com a liberdade do autor, aponta para um novo diálogo que o fazer cinematográfico precisa estar imbuído. Quebra-se mais uma vez a linearidade. Parte-se o veio aristotélico que consagrou as narrativas, mas que aos poucos foi redefinindo-se. Aristóteles classifica. Vive-se o estado da “metafísica de artista” que Nietzsche pensou. Lynch experimenta.
"Cidade dos sonhos" parece funcionar como uma passagem, como um entre cinema que busca na relação autor/público uma nova forma de dialogar com a verdadeira função da arte: precipitar os sonhos. Esquecer a crítica. Essa, sobretudo. Silêncio

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Memória. Algumas datas são reais, outras de minhas memórias


323 a.C "É óbvio, então, que a memória pertence àquela parte da alma à qual a imaginação também pertence (Aristóteles)"




1978- "Uma vida sem memória não seria uma vida", (Luis Buñuel)




432 a.C - "Ah, memória, inimiga mortal do meu repouso!"( Miguel de Cervantes )


2004- "Bem aventurados os esquecidos pois desfrutam até dos próprios erros" (Nietzsche)



1- "A memória é o espelho em que vemos os ausentes. "( Joseph Joubert )




1885 - "Ireneo começou por enumerar, em latim e espanhol, os casos de memória prodigiosa registrados pela Naturalis historia: Ciro, rei dos persas, que sabia chamar pelo nome todos os soldados de seus exércitos; Metríadates e Eupator, que administrava a justiça dos 22 idiomas de seu império; Simónides, inventor da mnemotecnia; Metrodoro, que professava a arte de repetir com fidelidade o escutado de uma só vez. Com evidente boa fé maravilhou-se de que tais casos maravilharam. Disse-me que antes daquela tarde chuvosa em que o azulego o derrubou, ele havia sido o que são todos os cristãos; um cego, um surdo, um tolo, um desmemoriado. (Tratei de recordar-lhe a percepção exata do tempo, a sua memória de nomes próprios; não me fez caso.) Dezenove anos havia vivido como quem sonha: olhava sem ver, ouvia sem ouvir, esquecia-se de tudo, de quase tudo. Ao cair, perdeu o conhecimento; quando or ecobrou, o presente era quase intolerável de tão rico e tão nítido, e também as memórias mais antigas e mais triviais. Pouco depois averiguou que estava paralítico. Fato pouco o interessou. Pensou (sentiu) que a imobilidade era um preço mínimo. Agora a sua percepção e sua memória eram infalíveis." (Borges)




2048 - A memória é uma ilha de edição (Waly Salomão)




1900- "Justamente porque a lembrança de intuições anteriores análogas é mais útil que a própria intuição, estando ligada em nossa memória a toda a série dos acontecimentos subseqüentes e podendo por isso esclarecer melhor nossa decisão, ela desloca a intuição real, cujo papel então não é mais [...] que o de chamar a lembrança, dar-lhe um corpo, torná-la ativa e conseqüentemente atual." (Bergson)








terça-feira, 22 de abril de 2008

Aforismo


"Aforismo significa explicar o que é Aforismo em poucas palavras" - Tharley Mota


α- Todos os verbetes da wikipedia;

β- Estilo de pensadores de vanguarda;

γ- Maneira encontrada por Friedrich Nietzsche de implodir a moral cristã, o Estado, Sócrates, Descartes, Kant e cia;

δ- Maneira encontrada por Friedrich Nietzsche de dizer que "graças à música as paixões possuem a si mesmas"

ε- O texto de Cool memories, de Jean Baudrillard;

F- No princípio era o aforismo;

ζ- Pensamento sinuoso, espiral, assintótico como a letra zeta do grego;

η- Meu primeiro aforismo: "Não se pode precisar ao certo, mas evidentemente Adorno entrou em algum shopping center brasileiro e presenciou um espetáculo que lhe abriu um largo sorriso (embora fazer sorrir não seja sua função). As lojas não tinham nomes em inglês como de costume, o chão não estava perfeitamente encerado e os rostos não estavam embasbacados pelo consumo. Os nomes estavam pichados, o chão enlameado e os olhares diziam pouco. Nas salas de cinema os heróis saíam das telas desiludidos, pois não havia público, nas escadas rolantes ficavam presos os sonhos de quem pretendia abrir uma nova loja, ou comprar o mais novo cd da banda criada no programa de televisão. Nas praças de alimentação distribuía-se comida a quem sentia fome e uma banda tocava uma marcha fúnebre. Néstor Garcia Canclini ao cunhar a expressão “o consumo serve para pensar” pode não ter levado em consideração que alguém como Adorno iria um dia a um shopping center." ;

θ- A poesia é a arte do aforismo;

ι- Algumas piadas como essa: Satanás não agüentava mais ter que aturar Karl Marx no inferno. Era o tempo todo aquela história de diabos exploradores contra diabos explorados. E toma O Capital, luta de classes, o Demo já tava por aqui. Resolve, então, ligar para o céu e pedir para Deus ficar um pouco com o Marx lá. Deus topa. Passa alguns dias, Satanás liga novamente para saber como vão as coisas. Quem atende é São Benedito. - Alô, São Benedito? Aqui é Satanás. Me chama o São Pedro aí pra me informar como é que Deus tá se virando com o Marx no céu. - Em primeiro lugar, caro Satanás, me chame Camarada > Benedito. Em segundo, o Camarada Pedro está em greve. E em terceiro, Deus não existe!







quarta-feira, 16 de abril de 2008

Epifania


1- De Joyce no "Ulisses": 'Remember your epiphanies on green oval leaves, deeply deep, copies to be sent if you died to all the great libraries of the world, including Alexandria? Someone was to read them there after a few thousand years....'
2- Alguns blogues
3- Mais que imagens; sensações
4- Luz que rompe com as luzes
5- Aparições
6 - Alguns fantasmas como a escrita...
7- Os publicitários tentam através do brainstorming, raramente tendem a conseguir, mas quando isso acontece...87,64% dos jornalistas desconhecem a palavra.
8- Os artistas começaram a achar que ela era dispensável... Adorno criou o termo Indústria Cultural
9- Do grego πιφάνεια...
10- Sonho dos gregos pré-socráticos. Platão era um homem sem epifanias, daí suas aporias...
Próxima classificação: Aforismo

domingo, 6 de abril de 2008

Classificações




Michel Foucault em “As palavras e as coisas - uma
arqueologia das ciências humanas”, cita um texto de Borges sobre “uma certa enciclopédia
chinesa” que clasifica os animais em:

" a) pertencentes ao imperador, b) embalsamados, c)
domesticados, d) leitões, e) sereias, f) fabulosos, g) cães em liberdade, h) incluídos na presente classificação,
i) que se agitam como loucos, j) inumeráveis, k) desenhados com um pincel muito fino de pêlo de camelo, l) et
cetera, m) que acabam de quebrar a bilha, n) que de longe parecem moscas”.

Esse fragmento, que eu nunca li diretamente em Borges, me inspira pra compor - aqui no blogue - uma série de fragmentos sobre algumas definições que me compõem há algum tempo. Nunca pensei, incicialmente, que meu blog me permitisse (me permitam pensar 10 mandamentos da Ponte sobre o abismo): 1) expor minha intimidade; 2) classificar as palavras e coisas que gosto; 3) de forma inumerada; 4) traduzir meus agitos e minhas loucuras; 5) acreditar fielmente que: só existem traduções; 6) a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, k, l, m, n; 7) 8; 8) 8,1 - 8,2 - 8,3 - 8,4 - 8,41 - 8,42... (série de números); 9) classificar qualquer coisa; 10) que a cada dia do mês que completo trinta anos listasse, marcasse, arquivasse...


A primeira palavra da minha enciclpédia chinesa, com dedicatória de Borges e prefácio de Michel Foucault:
Utopia - do grego ο, "não" e τόπος, "lugar". Aquilo que não tem lugar, não-lugar, sonho.
a) também, segundo alguns, aquilo que não tem lugar ainda, sonho que não aconteceu, ainda; b) todos meus pensamentos; c) compreender Borges, sem Foucault; d) e vice-versa; e) os mandamentos da ponte sobre o abismo; f) todos os lugares; g) as músicas instrumentais; h) os filmes mudos; i) fuga; j) acreditar que não há um minotauro no labirinto; k) pensamento (que, em algum idioma quer dizer, o que não tem lugar),; l) heterotopias; m) o capital; n) o comunismo (inclusive, onde ele ainda sobre-vive).

domingo, 30 de março de 2008

do Emir

http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=172

caros alunos

http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=3833

SOMOS quando TRANSITAMOS


Transitamos...

entre a memória e o orgulho
entre o devir e o tolo
entre "o animal que logo sou" e o "penso logo existo"
entre o e e o ou ( que sempre nos faz Ou ou E)
entre o filho e o pai
entre as convicções e os paradigmas
entre "o eu é um outro" e Eu
entre Sócrates e Nietzsche
entre o penalti e o goleiro
entre a linguagem e a falta dela
entre a música e as paixões
entre o meio e a mensagem
entre a infância e a velhice
entre a tudo que chega e a tudo que sai
entre o perjúrio e a promessa
entre "o rio que entramos e não entramos" e a "univocidade do ser"
entre a borda, a margem, a assíntota e o centro, o dentro, o fora.
entre o clássico e o moderno
entre o barroco e o abstrato
entre o som e a fúria
entre o ícone, o índice e o símbolo
entre os toques no teclado e as imagens na tv
entre Hollywood e o filme queimado
entre Eros e Tanatos, mas também entre ratos, lobos, armadilhas, usinas inteiras
entre guerras e mães
entre a mão e o córtex
entre a informação e a comunicação
entre as palavras e as coisas


Somos, fomos ou seremos ... Arquivos

domingo, 23 de março de 2008

Para Jean Budrillard: a acidez que educa

A verdade nasceu da ilusão
O real nasceu da falta de imaginação
A imaginação do pensamento é mais preciosa que o próprio pensamento

Entrei em contato pela primeira vez com um texto de Jean Baudrillard em 2002, ainda com a dúvida se a opção pela carreira acadêmica tinha sido a mais acertada. Estava ainda em um curso de graduação, após ter abandonado dois outros, e tinha como horizonte a vida na Universidade. O livro era “Cool memories IV” e alguns de seus aforismos – cito dois aqui – me convenceram que sim; que fazer jornalismo para dar aulas seria minha grande decisão em uma sociedade pautada pelo consumo, pelo excesso de comunicação, pelo simulacro. Temas recorrentes do texto do pensador francês me ajudaram, ao lado de outras provocações de sua ácida escrita a enfrentar o dilema proposto pela educação. Baudrillard com seu tom provocativo convida-nos educadores a uma discussão séria sobre as escolhas de quem ensinamos nas sociedades dos diversos rótulos - e longe de uma vocação educativa.
O primeiro daqueles aforismos bem curto dizia: “A ordem social nos ensina a calar, mas não nos ensina o silêncio”. Dele, o impacto de que, apesar dos pesares, temos voz. Primeira dúvida naquele momento, como usá-la? O segundo, um pouco maior, diz respeito às referências do autor. Ambos se encontram no livro citado, lançado no Brasil pela Estação Liberdade. O volume de número IV completa a série de suas “memórias frias”. Reproduzo então o outro aforismo.

“Cito somente aqueles que admiro porque souberam dizer melhor do que eu o que eu queria dizer. Ou o que sinto que poderia escrever. É como declinar nosso pensamento por meio de outra pessoa, que o restitui, como se nós o tivéssemos dado a ela. Que ele tenha sido pensado antes, que tenha sido pensado melhor é então um sinal compartilhado, um sinal predestinado, como um objeto que se oferece ao objetivo. Esse prazer da citação é portanto extremamente raro, e assim deve continuar a ser”.

A citação anterior nos coloca, escritor e leitor, no real objetivo dessas linhas: Baudrillard e as referências nos colocam em movimento. Aqueles que nós admiramos nos colocam em movimento. O pensamento é um movimento. Ensinados a não calar, e sim a explorar o legado da teoria crítica que Baudrillard não abria mão –e que qualquer outra também não pode fazê-lo no contemporâneo- pensamos e homenageamos aqueles que nos movimentam a pensar . Escrevemos sobre aqueles que admiramos, pensamos com aqueles que nos formaram. E nesse mover-se entramos em contato com uma ação. Embora o apocalipse dobrasse as linhas do texto de Jean Baudrillard, sua busca e produção incessante por respostas são saudáveis influências. Pra quem ensina e pra quem aprende.

Pelo percurso, evidentemente, encontramos exageros, mas o que seria do movimento do pensamento se não beirasse o excesso. O que seria da guerra se não fosse sua mídia. O que seria do cinema se não suas influências. Os irmãos Wachowski, diretores de “Matrix”, assumiram publicamente a influência de Jean Baudrillard na concepção do filme, embora Baudrillard diga que os autores não entenderam bem suas teorias. Ficou o excesso. Na tela, o livro “Simulacros e Simulações” guarda os programas do Hacker Neo, personagem de Keanu Reeves, e no exagero hollywoodiano ganhou o pensamento. O filme é parada obrigatória de diversos cursos de filosofia, por exemplo.
A imaginação do pensamento, os excessos do pensamento, a influência do pensamento. Três lições de vida para continuar a se descobrir Jean Baudrillard... Se não bastar, nas palavras do próprio em “A ilusão vital” (2001) uma provocação em tempos de clonagem: “ Mas se a vida é preciosa, é justamente porque ela não tem valor de troca – porque é impossível trocá-la por algum valor final”. Na sociedade das trocas, ‘baudrillar’ é preciso....

O sociólogo francês Jean Baudrillard morreu em Paris em seis de março de 2007 aos 77 anos.

terça-feira, 18 de março de 2008

Nossa Casa




A nossa casa não é nosso lar, a nossa casa tem na esquina um belo bar
pra matar a sede de quem tem
pra saciar a fome de quem não tem
um amor

A nossa casa não é nosso lar pra brindar com aquele amigo, como é que vai?
a nossa casa tem cachorro, criança no colo do pai

A nossa casa não é de todo nossa é de quem quiser aqui entrar
pra contar um caso pra tomar café
A nossa casa sempre tá em pé

Para aquele pobre coitado que não sabe bem qual é!


A nossa casa não é minha e tua
fica no meio de uma escura rua
e entre os teus cabelos e vestidos
ouço alguém bater na porta, mas não pode ser você(pois vc não quer entrar)

pois você não quer a casa,
pois você não vê a graça

A nossa casa tem elevador, sujeira e um cobertor
A nossa casa tem labrador, cigarros e um novo amor
Entro estou a vontade, apesar de tanta dor
saio, apago a luz, tomo um ar, solto a voz de tenor

E um grito desesperado me faz pensar que a nossa casa é de um porto, o cais
mas é também mais... um precipício, um abismo aliás

Nossa casa não tem nada demais.

domingo, 9 de março de 2008

Estéticapolítica

"Eis a


estetização da política,


como a pratica o fascismo.


O comunismo


responde


com a politização da arte"

(Benjamin, W.)

sábado, 8 de março de 2008

Sonho, técnica, sensação. SURROUNDED

Sabia da apresentação do Dream Theater, mas não dei muita bola. Um dia antes do show, um grande amigo recém-chegado de Angola liga dizendo que tem ingresso sobrando. Hesitei um pouco, mas logo já estava convencido de que veria mais uma vez os americanos do metal progressivo que fazem do sonho, teatro. Da primeira vez conhecia as músicas de trás pra frente. Dessa, nem o nome do último disco sabia. Mas lá, com um som prá lá de perfeito, a história é a mesma. Música pra cabeça. Música cerebral. Sonhos; imagens cercadas por técnica. Instrumentos que domados pela mão humana elevam o nosso juízo de gosto. Estética e técnica que convergem para o labirinto das nossas mentes. Sim, é som pesado, guitarras com distorção, pedal duplo, solos com velocidade e feeling, longos temas. E logo no início a bela Surrounded http://www.youtube.com/watch?v=WebiZCvLIE4, com direito a solo de Mother - aquela que mais nos cerca sempre - do Pink Floyd. Música que nos faz repensar nossa condição de demasiado humano. Valeu Jack-o!

quinta-feira, 6 de março de 2008

Voltando a reler os panfletos situacionistas, a teoria e prática da revolução, ou aquilo que realmente poucos ainda querem de fato, que " as idéias voltem a ser perigosas", me deparo uma vez mais com o dilema entre política e estética. Se no auge do situacionismo, Debord, Piero Simondo, Elena Verrone e cia fizeram a aliança entre o estético e o político, nos dias de hoje, com o espetáculo absoluto fica cada vez mais difícil se posicionar. Sim, trata-se de posições. É cada vez mais fácil ouvir, e confesso que as vezes participo do time: vejo o último estouro de hollywood da mesma forma que me encanto com o underground mais soterrado do submundo das artes. O que essa postura, de fato neosituacionista, gera é o velho conformismo, que bradavam os situacionistas. "A cultura? Mas essa é a mercadoria ideal que obriga a comprar todas as outras..." Como separar os cacos pós-modernos do espetáculo/controle contemporâneos? E por onde andam os filmes contra a arte, ao lado da arte?

sábado, 1 de março de 2008

Artes e pessoas

"A uma arte assim
cosmopolita
assim universal, assim sintética,
é evidente que nenhuma disciplina pode ser imposta, que não a de sentir tudo de todas as maneiras, de sintetizar tudo, de se esforçar por de tal modo expressar-se que dentro de uma antologia de arte sensacionista esteja tudo quanto de essencial produziram o Egipto, a Grécia, Roma, a Renascença e a nossa época. A arte, em vez de ter regras como as artes do passado, passa a ter só uma regra - ser a síntese de tudo. Que cada um de nós multiplique a sua personalidade por todas as outras personalidades."

“A única realidade da vida é a sensação. A única realidade em arte é a consciência da sensação."

"Eu era um poeta impulsionado pela filosofia, não um filósofo dotado de faculdades poéticas."


"Todos os meus escritos ficaram inacabados; sempre novos pensamentos se interpunham, associações de idéias extraordinárias e inexcluíveis, de término infinito.....................................O Caráter da minha mente é tal que odeio os começos e os fins das coisas, porque são pontos definidos."





Fernando Pessoa

COMUNIDADE E CIBERCULTURA: NOVOS DILEMAS DAS IMAGENS EM MOVIMENTO?


Algumas questões advindas com a tecnologia inauguram novos caminhos a serem trilhados por quem produz e consome cinema. Fenômenos na World wide web como as comunidades virtuais (Orkut, Myspace) e a nova sensação Youtube trazem à tona novas formas de se ler o cinema no contemporâneo. O próprio fazer cinematográfico também passa por interessante metamorfose, que novamente remete a pergunta sobre seu fim, mas que indica, sobretudo, novas possibilidades. Na denominação pós-cinema, novos conceitos são suscitados apontando para arte cinematográfica um novo mar, ou seria uma nova estrada de ferro? As imagens em movimento partem em seu trem para uma nova aventura. O trem parte da estação de Ciotat[1] rumo aos espaços da virtualidade. O mar da cibercultura é também cinematográfico.
O conceito de comunidades virtuais criado por Howard Rheingold e recortado por Henrique Antoun “considerava as comunidades virtuais capazes de recriar o tradicional sentido de participação e envolvimento das antigas comunidades, constituindo uma revitalização da esfera pública e social”[2]Pensar o envolvimento da arte cinematográfica com o ciberespaço para entender uma participação maior dos indivíduos em torno do esquecido rótulo Comunidade é dar novos ares ao cinema. Na história do cinema alguns movimentos já possibilitavam detectar essa relação. O neo-realismo, os cinemas novos e parte do cinema político não são reeditados com a internet, mas ganham novos contornos com a liquidez promovida pela interatividade e com alguma liberdade que o novo meio proporciona ao pensarmos na relação com a comunidade.
Não somente em termos de uma mudança em relação aos veículos existentes ou de reformulação, mas, sobretudo no que tange a uma nova concepção de fazer comunicação, vínculo entre os sujeitos, deve ficar o pensamento comunitário e sua relação para com o cinema. Coloca o filósofo da desconstrução, Jacques Derrida, pensando um novo Estado sob a égide das novas tecnologias.

Um estado virtual cujo lugar fosse um site da internet, um Estado sem solo, seria –eis a questão que nos orienta _ um Estado intelectual? Um Estado cujos cidadãos fossem essencialmente intelectuais, intelectuais enquanto cidadãos? Uma questão de ficção científica? Não acredito de modo algum[3].

O próprio virtual redesenha, e o pensamento sobre a comunicação tenta redefinir muitos conceitos, a relação do sujeito contemporâneo com a nova tecnologia da informação e da comunicação em rede. Um estado sem solo na internet mediado pelas questões das imagens em movimento também não nos parece questão de ficção científica. Em meio a esperanças democráticas, mudanças na subjetividade, interatividade e uma virtualização da realidade, o cinema pode ser pensado ainda como o meio que une o fantástico ao tecnológico, mas que acima de tudo traduz de forma poética os anseios de um mundo melhor. Como coloca Deleuze, o cinema é algo que nos faz crer nesse mundo.
[1] A referência aqui é ao primeiro filme mostrado ao público dos irmãos Lumiere “A chegada do trem à Estação Ciotat” (Arrivée d´un train in gare à la Ciotat, 1895).
[2] Henrique Antoun, O poder da comunicação e o jogo das parecerias na cibercultura, XIII Compós, p.3
[3] Jacques Derrida, Papel máquina, São Paulo, Estação liberdade, 2004. p. 214

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Sobre um ano atrás em sua casa

Sou classe médiaPapagaio de todo telejornalEu acreditoNa imparcialidade da revista semanalSou classe médiaCompro roupa e gasolina no cartãoOdeio “coletivos”E vou de carro que comprei a prestaçãoSó pago impostosEstou sempre no limite do meu cheque especialEu viajo pouco, no máximo um pacote cvc tri-anualMais eu “to nem ai”Se o traficante é quem manda na favela (...) Mas se o assalto é em moema O assassinato é no “jardins”A filha do executivo é estuprada até o fimAi a mídia manifesta a sua opinião regressaDe implantar pena de morte, ou reduzir a idade penalE eu que sou bem informado concordo e faço passeataEnquanto aumenta a audiência e a tiragem do jornalPorque eu não “to nem ai”Se o traficante é quem manda na favelaEu não “to nem aqui”Se morre gente ou tem enchente em itaqueraEu quero é que se exploda a periferia todaToda tragédia só me importa quando bate em minha portaPorque é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida ( Max Gonzaga)
http://www.youtube.com/watch?v=3uR_nfu0yV0


O teórico da mídia Marshall McLuhan termina assim seu capítulo dedicado a imprensa na obra “Os meios de comunicação como extensões do homem”: “Os donos dos meios sempre se empenham em dar ao público o que o público deseja, porque percebem que a sua força está no meio e não na mensagem ou na linha editorial”. Tal afirmação enfatiza uma vez mais a máxima do autor de que “o meio é a mensagem”, que necessita ainda – e cada vez mais - de muita exploração para se chegar a qualquer explicação. Para lembrar, McLuhan era um otimista quanto ao veículo televisivo e o precursor de uma análise categórica sobre esse medium. McLuhan, que muitos consideram hoje também o arauto do pensamento sobre a internet, teria vasto material para suas análises nos dias de hoje. Sob a primazia do meio vivemos. Sob a confluência dos meios navegamos. Precisamos com urgência habitá-lo de outras formas. Essa outra forma passeia por aqui, pelos blogs, pelas possibilidades da rede. O texto que segue data de um ano e é mais uma vez uma crítica aos media. Cito novamente, e um ano atrás, o BBB. De uma terça-feira de 2007 tento pensar uma situação que parece não ter fim; poderia falar de ontem da entrevista de Steven Johnson ao “Roda Viva”, enquanto rolava mais um Big Brother, mas fico com um texto de um ano atrás, com a capa da Veja de um ano atrás para lembrar que ainda “a mídia manifesta a sua opinião regressa...”
O intuito desse artigo é propor o que a grande imprensa não vem fazendo de há muito: Explorar. Vasculhar o meio televisivo no sentido de discutir que por melhor que seja seu conteúdo é ainda a forma e os agenciamentos mediados por essa forma que dão as cartas. Esse desbravar se dá numa só noite. Que fique o exercício para os alunos dos cursos de Comunicação Social pelo Brasil espalhados. Que fique o exercício para os cidadãos que não mais apáticos somente assistem. Na terça-feira, dia 27 de fevereiro de 2007, a televisão brasileira dava uma aula sobre a relação apontada por McLuhan sem perceber. Ao mesmo tempo em que a TVE discutia com brilhantismo no seu “Observatório da imprensa”, a postura dos meios de comunicação, sobretudo o veículo impresso, diante do bárbaro assassinato do menino João Hélio, arrastado por ruas do Rio de Janeiro, a Rede Globo de Televisão exibia - com uma edição impecável - no seu Big Brother, o já famoso Paredão.
Enquanto convidados como o filósofo Renato Janine Ribeiro e a jornalista Tereza Cruvinel se empenhavam em pensar a relação entre a mídia e a violência e como pode a imprensa fazer algo para compreender as causas de tamanha crueldade, grande parte do Brasil se comovia com outra crueldade: aquela que dizem estar sendo cometida contra alguns participantes na casa do Big Brother Brasil e que serve para aliviar um pouco do sentimento de incredulidade que ainda ronda o povo brasileiro. De casa esse espectador tentava dividir sua atenção entre os dois canais e ainda dava parte de seu olho e corpo ao “Superpop” da REDETV, que exibia o imperdível debate com título parecido com “A maldição das novelas: os atores que sofrem a influência de espíritos malignos”.
No capítulo sobre a televisão do mesmo livro citado no início dessas linhas McLuhan dá a mensagem para explorar essa questão: “Acima de tudo a Tv é um meio que exige repostas criativas e participantes”. Cabe ao mesmo público que McLuhan menciona colocar o Big Brother no paredão? Será essa a alternativa? Que seja, sem problema. Mas não é única. Como meio e mensagem dialogam em uníssono, cabe ao público ainda um espasmo em nome de um meio que lhe interesse mais, já que pelo conteúdo belos programas como o da TVE aqui mencionado parecem cada vez mais relegados a um público muito específico e preteridos pelo “que o público deseja”. Unidos pela artimanha da indústria cultural precisamos cada vez mais reler McLuhan para entender o matrimônio entre meio e mensagem. Até que o Youtube os separe e possamos observar o que um outro meio pode fazer. Atento a televisão, McLuhan profetizava e rede mundial de computadores. A rede é a mensagem. Atentos ao Grande irmão - Globo ou qualquer outro produto da tv comercial brasileira - e a sua extensão impressa - Veja ou qualquer outro produto da mídia "pseudoindignada" - repensar os meios é tarefa de quem estuda os meios.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Cotidiano


O mundo é tão cotidiano.
A nicotina tem destes efeitos
Ficar a imaginar palavras perfeitas pra falar.
É muita Pressão.
Porque tudo é informação

O controle da vida não é o remoto.
O remoto da vida não é ter controle.

Quem quer pensar.
Pensar em algo para não se falar.


Então nada é cotidiano
As nossas vidas são só defeitos
Ficar a imaginar acordes perfeitos pra tocar
Na maior tensão
E graças à ARTE eu vivo paixão

A pintura da vida não é abstrata
O abstrato da vida não é uma pintura

Vamos borrar
o quadro, a tela de tanto tentar


É tudo. É nada. É cotidiano
Esquecer e lembrar de todos os feitos
Os dias são agitados, parados, perfeitos pra sonhar
Sem muita noção
Somos todos bobos da corte da população.

O crime da vida não foi tão perfeito
O perfeito da vida é mais que um crime

Pra querer tratar
cada pedaço em todo o espaço
como um traço, um laço pra nos amarrar.


Letra em parceria com Mau Abrahão

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Cidades visíveis...





"A cidade é redundante: repete-se para fixar alguma coisa na mente.
A memória é redundante: repete os símbolos para que a cidade comece a existir".



Ítalo Calvino, As cidades invisíveis

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

ARCÁDIA

Cercado em grades
Medo ao caminhar
Vejo nessa gente
Um pranto a rolar
Da cidade fujo
Tento me esquivar
Dos golpes dos mundo
Do sofrer penar

Pra loucura corro
Sem nem mais pesar
Penso, existo,
Lembro de um lugar

Um lugar pra aproveitar
Um lugar pra aproveitar

Pra loucura corro
Sem nem mais pesar
Penso, existo,
Lembro de um lugar

Um lugar pra aproveitar

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Música de imagens

Cada vez mais volto a me interessar pelos videoclipes. Não sei se por ter orientado no semestre passado um trabalho sobre o Michel Gondry, não sei se por ter voltado a assistir muitos vídeos. Talvez pelo desejo da realização dos vídeos prometidos ao Rizoma (que esse ano sai). Ontem pela manhã em meio a folia, consegui parar para começar a ler "Na Multidão", novo do Garcia-Roza. Espinoza, persoangem principal - inspirado no filósofo - é mais que um delegado investigativo. Espinosa é vídeo. Rápido, direto, iconográfico. Bem, mas não é dessa leitura que pretendo rapidamente traçar algumas linhas (ela fica pro término do livro, que aliás, pra variar, começou muito bem).
Zapeando a MTV, mais uma vez 0 Gondry. Desssa vez o maravilhoso "Let forever be", dos Chemical Brothers. (http://www.youtube.com/watch?v=Hmpxsk3dHaA). Cheio de imagens de imagens, o clipe com fortes elementos da vídeoarte, sabe como explorar a bateria nota 10 que marca a música. Michel Gondry é músico. Pega as linhas melódicas, as frases, o ritmo e a harmona, e as lê com imagens. Anamorfoses, planos abstratos e muita inspiração.

A noite, depois de 4 escolas desfilando sem nenhuma vocação videoclíptica, lembro de 'Romance Sentimentale' ( Sergei Eisenstein e Grigori Alexandrov, 1930). Deixo o carnaval e parto para a música de imagens. Traduzido como Sonata da primavera, esse curta é tido como um dos primeiros videoclipes. Alternando imagens profundamente sensoriais ( de uma natureza carnavalescamente viva) e uma mulher ao piano ( interpretada por Mara Griy), o curta-clipe do gênio russo é cinema que cumpre sua vocação. Ter como conteúdo a música. Ou se preferirem, como Bressane captou: " O cinema é a música da luz".

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

CARTA ABERTA A JOHN ASHBERY

"A memória é uma ilha de edição - um qualquer

passante diz, em um estilo nonchalant,

e imediatamente apaga a tecla e também

o sentido do que queria dizer.


Esgotado o eu, resta o espanto do mundo não ser

levado junto de roldão.

Onde e como armazenar a cor de cada instante?

Que traço reter da translúcida aurora?

Incinerar o lenho seco das amizades esturricadas?

O perfume, acaso, daquela rosa desbotada?




A vida não é uma tela e jamais adquire

o significado estrito

que se deseja imprimir nela.

Tampouco é uma estória em que cada minúcia

encerra uma moral.

Ela é recheada de locais de desova, presuntos,

liquidações, queimas de arquivos,divisões de capturas,

apagamentos de trechos, sumiços de originais,

grupos de extermínios e fotogramas estourados.

Que importa se as cinzas restam frias

ou se ainda ardem quentes

se não é selecionada urna alguma adequada,

seja grega seja bárbara,

para depositá-las?




Antes que o amanhã desabe aqui,

ainda hoje será esquecido

o que traz a marca d'água d'hoje



Hienas aguardam na tocaia da moita enquanto

os cães de fila do tempo fazem um arquipélago

de fiapos do terno da memória.

Ilhotas. Imagens em farrapos dos dias findos.

Numerosas crateras ozonais.

Os laços de família tornados lapsos.

Oco e cárie e cava e prótese,

assim o mundo vai parindo o defunto

de sua sinopse.

Sem nenhuma explosão final.




Nulla dies sine linea. Nenhum dia sem um traço.

Um, sem nome e com vontade aguada,

ergue este lema como uma barragem anti-entropia.




E os dias sucedem-se e é firmada a intenção

de transmudar todo veneno e ferrugem

em pedaço do paraíso. Ou vice-versa.

Ao prazer do bel-prazer,

como quem aperta um botão da mesa

de uma ilha de edição

e um deus irrompe afinal para resgatar o humano fardo."

Waly Salomão

As lembranças eternas de um brilho que não mente


“Benditos os esquecidos, pois desfrutam até dos próprios erros”. É com essa citação de Nietzsche que a personagem Mary, vivida por Kirsten Dunst, refere-se a memória que vai sendo apagada dos personagens centrais de Brilho eterno de uma mente sem lembranças . Esse texto é um erro, talvez.

Em um filme onde uma história de amor, técnica, psique e criatividade se confundem, lembrá-lo uma vez mais é necessário. A relação do filme com autores como Nietzsche, Freud e Bergson é não só a tônica desse artigo sem muitas memórias, mas caminho para não esquecê-lo. Não é devido a quantidade de livros recentes relacionando a filosofia ao cinema que tentamos aqui compreender a e-ter-ni-da-de de ‘Brilho’. Talvez a reboque da questão de um outro filósofo - esse com os dois pés fincados sobre o cinema - possamos dar entrada no que propomos. Um dia a pergunta o que é o cinema será reformulada, advertia Gilles Deleuze nas considerações finais de sua segunda obra sobre a arte cinematográfica, ‘A imagem-tempo’. Em suma perguntar o que é o cinema será perguntar o que é o pensamento, percebe Gilles Deleuze.

Delueze nos liga ao filósofo citado no filme. Friedrich Nietzsche é um dos primeiros pensadores a perguntar sobre outros mecanismos para se pensar o pensamento. De Nietzsche, que pouco ouviu falar do cinema, ficamos aqui com um breve recorte da memória em tom sempre aforismático. “Fui eu que fiz diz minha memória. Não posso ter feito isso, diz o meu orgulho, e mantém-se irredutível. No final é a memória que cede” (NIETSZCHE, 2002). Essa observação nos facilita na compreensão de um todo que paira sobre o filme. No mesmo sentido da citação que aparece abrindo esse texto ( e que constitui uma da mais belas seqüências do filme) a memória é um fantasma entre o tolo e o orgulho. Essa observação do filósofo do Eterno Retorno é crucial nessa análise sobre a memória no filme. Querido Waly, realmente “a memória é uma ilha de edição”. Frase a qual o cinema deve agradecer todos os dias. Todas as horas em que o pensamento é cortado pelas imagens em movimento, pelo movimento das imagens-memória.

Por esse viés da memória e com a retomada dos estudos na Comunicação da leitura de Henri Bergson, ‘Brilho eterno’ é mais que atual. O entendimento que propõe Bergson acerca da imagem em ‘Matéria e memória’ reduz a um “entre” o destino manifesto da imagem cinematográfica. Coloca o autor

A matéria, para nós, é um conjunto de “imagens”. E por “imagem” entendemos uma certa existência que á mais do qua aquilo que o idealista chama uma representação, porém menos do que aquilo que o realista chama coisa – uma existência situada entre a “coisa” e a “representação” (BERGSON, 1999).


O ‘entre-roteiro’ de Charlie Kaufman (Quero ser John Malkovich, Adaptação, Confissões de uma mente perigosa, A natureza quase humana) é um dos melhores dos últimos tempos, não por sua narrativa não linear, não por sua poesia, mas por sua preocupação amorosa de fazer do relacionamento humano uma ponte entre esse conjunto de imagens. Não à toa as imagens remetem a escombros como o amor. A memória no filme é algo que desmorona. Matéria que solapa idéia e representação. Por que Clementine Kruczynski (Kate Winslet) resolve tirar o companheiro Joel Barish (Jim Carey) da memória é importante questão que fica escondida com a entrada em cena de sua resposta: “Bem aventurados os esquecidos”.... Errar, como canta Cristiano Lyra da banda Rizoma, é acertar. (Perdoem as minhas lembranças na hora de compor essa lembrança). É assim que ao receber um cartão dizendo que foi apagado da memória Joel decide fazer o mesmo e esquecer para sempre Clementine. Matéria e memória são elementos centrais desse apagamento. Fotos e desenhos dividem com canecas e coleiras de cachorro espaço para trucidar a memória. A narrativa do filme transpõe uma ordem puramente semiótica da vida. Ordem a qual o cinema sempre quis ser devedor.

Como propõe Freud: “Bastar-nos-á, pois, saber o lugar no qual encontrar a recordação assim fixada para podê-la reproduzir”, o filme tenta encarar esse fantasma chamado memória. Comparando-a com o chamado “bloco maravilhoso” – um brinquedo antigo que retinha o desenho e depois com um simples movimento da folha que o protegia apagava o que tinha sido desenhado – Freud não fazia idéia do que a criatividade de um roteirista e a sensatez da direção de Michel Gondry podem fazer a mente e ao coração de quem assiste a esse belo filme. Mas fazia, e muito, idéia de que a memória é algo de fantasmagórico. As personagens do filme transpõem uma visão psicanalítica de mundo. Visão que o cinema sempre quis ser devedor.
Entre erros, fantasmas e gênios Brilho eterno de uma mente sem lembranças nos coloca em um labirinto das memórias. Mas de nossas memórias. Dela vem a referência a um autor despercebido. Benoist nos ajuda com a tarefa mais difícil que tem um texto, seu fim.

Em suma, nada pode ser por nós compreendido que não evoque uma de nossas recordações. Nada podemos reconhecer sem antes conseguirmos aproximá-lo de um precedente conservado na memória. Os pensadores de todos os tempos repetiram-no incessantemente (BENOIST, 1975)

Uma última recordação: O trem saiu da estação de Ciotat para a estação de Montauk...A Cine-Memória do mundo é uma vida de trens, recordações e pensadores.

REFERÊNCIAS

Benoist, Luc. Signos, símbolos e mitos. Lisboa: Edições 70, 1975.

Bergson, Henri. Matéria e memória. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

Deleuze, Gilles. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 1995.

Nietzsche, Friedrich. Para além do bem e do mal. São Paulo: Martin Claret, 2002.

Freud, Sigmund. O bloco mágico. Buenos Aires: Amorrortu, 1925.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

FARSAS, FILMES E SETAS QUE DOBRAM



Como todas as farsas enrolo teu cabelo
Beijo teu cotovelo
O que queres de mim é me prender
Não me deixar te esquecer

Mas o que quero de ti já ficou pra trás
E essa noite não me fez o bem
Que há tanto tempo faz
Me refaz, te refiz

Eu sigo um caminho torto
A sua seta não me seduz
A reta me deixa preso a sua cruz
É a dobra que me mantém.

Como todos os filmes troca-se o rolo
O ator se faz de bobo
O que fazer se a platéia perceber
(o que não fazer)

Mas a continuísta entra em cena
Me leva pra outro lugar
Bem mais minha cara
Ao anoitecer, leveza do ser
Juliete Binoche ao amanhecer

Longe de ti
Perto de mim
Perto do fim
Longe de Quem?

Longe de mim
Perto de ti
Longe do fim.
Perto de Alguém.




quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

RAZÕES

Ando pela rua ou numa estrada escura
Paro em frente a tua casa que é tua sepultura
Sou cheia de sorrisos falsos
Repleta de boas intenções

Mas tudo o que eu quero é destruir tuas sensações
Tudo o que eu quero é combater tuas emoções

Por que me chamam razão
Me pedem razões
Me chamam razão
Me pedem razões


Eu tomo os livros da tua estante
Eu sei que nada será como era (como era antes)
Me finjo em poesias concretas
Pareço até os melhores estetas

Mas tudo o que eu quero é desvelar tuas sensações
Tudo o que eu quero é confrontar tuas emoções

Por que me chamam razão
Me pedem razões
Me chamam razão
Me pedem razões

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

A imagem que pesa 21 gramas. O filme que pesa em nossas vidas. O peso da poesia cinematográfica de Alessandro Iñarritu e a questão do ser



“O peso morto de uma tradição de maus costumes
impede-a de apreciar em seu justo mérito
as intenções mais esclarecidas”
‘O seio nu’
Ítalo Calvino-Palomar





O cinema como produtor da realidade como propõe Deleuze em seu livro Conversações ou simplesmente um aparato, um dispositivo, uma técnica? Pode o cinema ser mais que realidade ou ficção, instrumento e prática? "21 gramas" de Alessandro Gonzáles Iñarritu mostra que o cinema pode ser vida, pode falar de forma explícita sobre a finitude. Não que tantos outros filmes não conseguissem, mas nessa experiência do diretor de Amores Brutos, o cinema é despertado do seu sono e sonho tecnológico para dar voz a dimensão do ser. E dar voz ao ser é mais uma vez a necessidade do pensamento.
No caso do filme, a imagem é responsável em todas as suas colorações por um convite ao retorno à discussão sobre a posição do homem diante do acaso, diante da limitação por esse imposta, diante da própria metafísica e, sobretudo, diante do outro. Obviamente não só a imagem poderia nos levar a pensar nessa concepção, ou como afirma Baudrillard em um belo aforismo

O conceito é irrepresentável, mas a imagem é inexplicável. Entre eles há, portanto uma distância irreparável. E por isso a imagem vive da nostalgia do texto e o texto da nostalgia da imagem ( Jean Baudrillard. Cool memories IV, São Paulo, Estação Liberdade. 2002 p. 8) .


Assim esse texto pretende analisar as imagens do filme de Iñarritu, pensando o conceito da morte que o texto traz e que o dispositivo imagético consegue captar de forma magistral. Do vôo das pombas em um céu azul a morte amarelada e cheia de vida do personagem Paul, vivido por Sean Penn, a concepção de uma nova vida, com a coloração branca da bela cena de amor entre os personagens de Penn e Naomi Watts, entra em cena a imagem do ser. A pergunta sobre o quanto se perde, ou se ganha com a morte desse "21 gramas" faz da nostalgia que Baudrillard propõe um sentimento verdadeiramente bom, um sentimento que somente a saudade poderia explicar e que propõe a nostalgia que o texto e imagem desse filme nos traz.
Os planos e a câmera, por vezes vertiginosa, por vezes delicada tecem com a fotografia uma combinação que "Amores Brutos", primeiro filme de Iñarritu, já dava conta. Técnica e estética como faces de uma mesma moeda, para usar expressão recorrente. Esse filme não poderia ser esquecido, pois a mesma questão envolvendo o ser parece estar nele desenhada. Amores brutos, que tem no seu narrador fora da história e no seu veio político um diferencial em relação a "21 gramas," possui a mesma preocupação com o ser. Fato que o cinema não esquece, mas que em alguns momentos se distancia.
Em "21 gramas", o diretor encara com a mesma naturalidade o desafio de contar uma história através de imagens que mesclam poesia e técnica para mostrar e comprovar que estamos realmente jogados no mundo, lançados no mundo como o movimento proposto na filosofia heideggeriana. É também no acaso das imagens e nas imagens do acaso, que o filme dialoga com a filosofia.
As cores - para ser mais exato, os timbres - dão vida ao filme de Iñarritu. Desenham verdadeiras peças, fotos, telas que fixam os olhos do espectador na história que, com um misto de dor/desejo/esperança, nos leva a refletir um pouco mais sobre a existência. Função que Carrière brilhantemente recorta sobre a sétima arte.

O cinema nos arrasta para fora de nós mesmos, retardando o movimento dos pulmões e do coração. É difícil continuar falando de realidade quando o que estamos fazendo é penetrar num corpo que não é nosso, num cenário que não é nosso (Jean-Claude Carrière. A linguagem secreta do cinema, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994, p. 75) .

Em "21 gramas", coração e pulmão são os órgãos que mais parecem simbolizar o que o filme se propõe. O ar e o amor são tratados com toda a dicotomia que merecem e os personagens Cristina e Jack, interpretados por Naomi Watts e Benicio Del Toro, emprestam seu fôlego e suas dores para dar brilho as imagens do filme. E se o corpo sem órgãos é realmente um limite como propõem Deleuze e Guattari se, a “ele não se chega, não se pode chegar, nunca se acaba de chegar” (Deleuze, Gilles. Guattari, Félix. Mil platôs Vol1, São Paulo, Editora 34, 2004, p. 9), vinte e um gramas parecem realmente ser liberados do corpo no exato momento da morte como gira a história desse instigante filme sobre a vida. A colocação de Carrière sobre a realidade que penetra em um outro corpo é redimensionada em alguns filmes contemporâneos que parecem mais reais que a própria realidade, seja pela vida que virou filme como aponta Neal Gabler, seja pela redefinição de realidade imposta pela virtualidade.
No filme, o peso das atitudes e as intenções precipitadas, motivadas pelo acaso dos acidentes impostos pela vida, ganham as explicações matemáticas de um professor, religiosas de um antigo perdido na vida - e temente em todos os sentido a Deus - e o desespero de uma mulher. As explicações tentam convencer-nos de que algo do inevitável poderia ter sido previsto, mas o destino que se cumpre também pode ser visto como crescimento. É aí que as imagens ganham sua força. Iñarriatu faz nascer das imagens uma nova concepção para os três mundos da diegese. Três histórias que se cruzam para imageticamente se encontrarem.
O filme que gira em função do acidente de carro que também faz três vítimas (um pai e suas duas filhas) salva a vida por alguns poucos meses do personagem de Sean Penn que recebe o coração do homem atropelado. Atropelos então começam a dar rumo às situações impostas pelas imagens captadas pelo diretor.
Para cada situação Iñarritu percebe uma câmera diferente, um olhar diferente. Do quadro pintado pelo rapaz que observa o acidente (em meio às folhas que cata e o som da frenagem do carro) à epifania da ida no veículo ensangüentado para o salvamento de uma vida que não quer ser salva, o filme parece tentar nos colocar juntos a intimidade da fragilidade da vida diante do acontecimento. Tal fragilidade é pintada com cores vibrantes. Com as nuances extremas que grandes pintores mostravam a vida e que poucos diretores de cinema conseguem ao lado de seus diretores de fotografia. Iñarritu consegue captar nas imagens colorações que dão clima em conjunto. Cores que remetem momento a momento, vale novamente lembrar, a problemática do ser.
Ao lado da cor, "21 gramas" coloca a angústia do homem no cerne da discussão. Faz isso com o belo texto do roteiro de Guillermo Arriaga. Faz o cinema distanciar-se da questão sobre seu aparato técnico e concentra-se no homem. No ser que reconhece sua finitude e que passa a conhecer o acaso. A preocupação do cinema de Iñarritu e de um grupo de pensadores-cineastas da atualidade nos leva a refletir sobre uma metamorfose que passa o cinema no mundo regido pelas novas tecnologias da comunicação e da informação ( esse próprio texto que publico aqui hoje, antigo em meus arquivos, renasce de outro filme que assisti por esses dias, o belíssimo Ballet mécanique (1924), de Fernand Léger. Um filme sobre a máquina que trata do ser, um filme experimental com um belo tema). Retomar, como propõe Burch a questão do tema de um filme não parece ser descabido em uma discussão como a que se tenta fazer nesse texto. Coloca o teórico:

Assim, se admitimos que o cinema, que já descobriu parte de suas potencialidades estruturais, deve considerá-las na escolha de seus temas, resta-nos perguntar “o que é um tema de filme”, ou, “o que é um bom tema de filme?” Ou ainda, “o que é um bom tema de filme hoje?” (James Dudley Andrew. As principais teorias do cinema – Uma introdução, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor 1989, p.49)

A epígrafe de Calvino - quando assisti "21 gramas" esse pintor de palavras não me saía da cabeça - que se apresentou como oportuna tenta dar conta da resposta às indagações de Noel Burch. Reler o homem e a moral como tenta "21 gramas" é observar com o senhor Palomar as intenções. Saber lidar com a intencionalidade nas decisões humanas como apresenta Iñarritu é compreender o peso morto que o homem parece estar se tornando, esquecendo o recado que ainda tenta o cinema lhe dar sobre a importância do ser no mundo que esquece dos acidentes, das cores, das imagens de verdade, em nome das infinitas reproduções, dos simulacros sem sentido da contemporaneidade. Falar do ser é falar de uma máquina...

Bibliografia
Andrew, James Dudley, As principais teorias do cinema – Uma introdução, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1989

Baudrillard, Jean, Cool memories IV, São Paulo, Estação Liberdade. 2002

Burch, Noel, Práxis do cinema, São Paulo, Perspectiva, 1992
Carrière, Jean-Claude A linguagem secreta do cinema, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994

Gilles, Deleuze. Félix, Guattari, Mil platôs Vol1, São Paulo, Editora 34, 2004

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Extemporâneos....

Eu prefiro quem ainda não descobriu àquele que possui a verdade.
Eu prefiro o outro àquele que finge clamar por morta sinceridade
não há nada que me faça mais feliz que um ano após o outro ( quanto um dia quando acaba)
Só um amigo correndo em linha reta apesar da vida de torto

Eu ainda prefiro meu jantar ao meio dia e um boteco de esquina
à ilusão dos falsos amores que relutam contra a verdade a dois
deixo para depois o trivial, o redundante e aquela palavra certa
que me pedem nas horas mais erradas. Acabo como sempre falando em demasia.
Pra todos que me amam e nada esperam em volta (pois pouco consigo dar)
também para aqueles que só me aturam, fingindo ou querendo gostar
a esses devo um pouco mais, deixo estar, para não confundir
mas não esqueço um dia sequer, mas sem sofrer

Daqui só levo quem quero, que dessa estrada de fim certo
nada fica, que dessa vida sem razão é melhor ficar com a sensação
mas também é bom ser ácido, sereno e até misericordioso. Um adorno,
pois de fé já me enchi e agora luto em ser apenas um bom repouso. Um samaritano

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008


"A especialidade me é impossível. Valho um sorriso. Você não é nem poeta, nem filósofo, nem geômetra - nem outra coisa. Você não aprofunda nada. Com que direito você fala daquil oa que não se consagrou com exclusividade?Eu sou como o olho que vê o que vê. Seu menor movimento muda o muro em nuvem a nuvem em relógio; o relógio em letras que falam. Talvez esteja aí a minha especialidade".


Paul Valéry

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Recrutar a filosofia. Refazer a classe média


Em tempos difíceis dizem que os filósofos são recrutados. O Rio de tempos eternamente difíceis recrutou há pouco a Força nacional. Antes recrutou a Eco 92, o Pan 2007. Recrutou-se os formadores de opinião, representantes dos mass media que esbravejam com seus textos contra os governos e esquecem que são mediadores. Acham-se meio. Dificilmente recruta-se o pensamento. Escrevo sem saber onde, como e porque publicar. Num blog, mandar por e-mail aos mais chegados, aos amigos. Escrevo mesmo pra minha memória, mas é que diante de tantos fatos e de algumas poucas leituras, alguns pensamentos insistem em vir à tona e serem trocados com os amigos. Dialogados. Não se trata de um tema, não há recorte, quando as idéias sangram... Quando os corpos são aniquilados nos complexos arremedos de espaço urbano, a comunidade se transforma em número.

“Os direitos do homem são axiomas: eles podem coexistir no mercado com muitos outros axiomas, especialmente na segurança da propriedade, que os ignoram ou ainda os suspendem, mais do que os contradizem: “ a impura mistura ou o impuro lado a lado”, dizia Nietzsche. Quem pode manter e gerar a miséria, e a desterritorialização-reterritorialização das favelas, salvo polícias e exércitos poderosos que coexistem com as democracias? Que social democracia não dá a ordem de atirar quando a miséria sai de seu território ou gueto. Os direitos não salvam nem os homens, nem uma filosofia que se retorritorializa sobre o estado democrático. Os direitos dos homens não nos farão abençoar o capitalismo. E é preciso muita inocência, ou safadeza, a uma filosofia da comunicação que pretende restaurar a sociedade de amigos ou mesmo de sábios, formando uma opinião universal como “consenso” capaz de moralizar as nações, os Estados e o mercado” ( Gilles Deleuze, Félix Guattari, O que é filosofia?, São Paulo, Ed.34, p.139).

Essa longa citação encontrada no livro que pergunta o que é a filosofia nos convida para pensar os dias de hoje dos brasileiros. Não abençoamos o capital como grande parte dos formadores de opinião. Um fantasma ronda o Brasil, o fantasma da democracia. Governo do povo, sobre o povo. Democracia que nos permite hoje falar de liberdade da imprensa. Mas não falar para o cidadão. Um fantasma ronda o Rio de Janeiro: a classe média que necessita dos dois eixos da reflexão anterior: das esferas do estado: polícias e exércitos; do mundo da comunicação: imprensa e consumo. A opinião universal de que o Rio não vai bem das pernas elege agora mais um carnaval para deixar o estado respirar. A bela canção de Max Gonzaga, “Classe média”, embora retratando a violência urbana de São Paulo devia ser o hino do espetáculo contemporâneo e espelho da classe média, ou classe mídia carioca: “Aí a mídia manifesta a sua opinião regressa de implantar pena de morte ou reduzir a idade penal. E eu que sou bem informado concordo e faço passeata enquanto aumenta a audiência e a tiragem do jornal”. Meios e estados safados em busca de um consenso para melhor passar os dias.




sábado, 19 de janeiro de 2008

ENSAIO SOBRE A PERICULOSIDADE DA VERDADE NO CINEMA E SEUS ASPIRAS. OU PARA ENCERRAR A DISCUSSÃO ACERCA DE TROPA DE ELITE SOB A LÓGICA GLAUBERIANA

Uma passagem da Estética do filósofo Hegel sobre a finalidade da arte é fundamental para compreender a relação entre cinema e ideologia para encerrarmos - por favor, de vez - a celeuma em torno de TROPADIELITI “(...) As obras de arte não são, em referência à realidade concreta, simples aparências e ilusões, mas possuem uma realidade mais alta e uma existência verídica. (....) Se se quiser marcar um fim último à arte, será ele o de revelar a verdade, o de representar, de modo concreto e figurado, aquilo que agita a alma humana.”. (HEGEL: Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999. p.464 .)
A polêmica em torno da obra de José Padilha revela o desconhecimento da verdade- com v minúsculo - da Arte. Justamente por tentar revelar a Verdade com V maiúsculo da realidade em termos hegelianos. Somos todos alvejados por balas de fotogramas. Somos capitãesnascimentomoura e alunos da universidade de cristo. Mas não pretendemos aqui de modo algum discutir o filme, exaustivamente analisado pelas mídias de massa e pelo próprio Padilha, mas, despertado por ele, trazer a baila algumas questões despercebidas pela crítica. Antes, uma pausa para a acusação do filme de fascista.
O neo-realismo italiano, movimento grandioso da história do cinema, tinha os pés fincados no regime de Mussolini e isso não foi problema para a corrente entrar na história como algo pra lá de libertário. Acusar de fascista a obra de Padilha é, no mínimo, não atentar para esse fato. A questão é que TROPADIELITI não inaugura nada de novo no cinema. Alertar é suficiente para arte ou sua função não é mais a de destruir como provocou Nietzsche? Troppaaaa não destrói, corrobora. Espetáculo puro pra Debord botar defeito.
Nem mesmo a discussão sobre a pirataria (que nada tem a ver com o filme) é nova. Cinema e pirataria sempre andaram juntos, pois piratas da perna de pau são os estúdios, os producers e seus delitos... Não inaugura, pois não é Arte. É comércio. Comércio de cópias e de Trajes do bope. Comércio de vídeos oportunistas e entrevistas do diretor. Trrrooppaa deve se pretender neo-realista, mas no máximo ele é clássico narrativo... Dialética e estética hegeliana.
Quanto as questões que não apareceram. Ficamos com pelo menos duas. 1- A figura do professor e sua aula em formato de seminários que assiste a apresentação de um Foucault que os foucaltianos devem desconhecer, que no quadro apresenta os nomes de Nietzsche (logo Nietzsche que revelava que graças a música as paixões possuem a si próprias - leiam cantando...”Tropa de elite osso duro de roer pega um pega geral também vai pegar você”....) e Deleuze (logo Deleuze que sempre estudou o cinema e as possibilidades de crença no mundo a partir da arte e que por isso cito: “O homem está no mundo como numa situação ótica e sonora pura. A reação da qual o homem está privado só pode ser substituída pela crença. Somente a crença no mundo pode religar o homem com o que ele vê e ouve” . É preciso que o cinema filme, não o mundo, mas a crença neste mundo, nosso único vínculo” - Gilles Deleuze, A imagem-tempo, São Paulo, Brasiliense, 1995, p.207.). A figura desse professor esquece seu papel para explicar o valor e não valor das instituições...
2 – O saco de gatos das ONG’s (ridicularizadas no filme e que ainda não se revoltaram contra isso) torna-se figura caricata como o personagem que a dirige, vivido de forma não tão caricata por André Mauro... A verdade da ONG de TROPADIELITI é apenas uma das verdades.
Que a crítica e Padilha não me perdoem por começar um texto como esse lembrando Hegel e por terminar conclamando a quem não assistiu, ainda, assistir Trrrrroooopà e depois correr para o comércio pirata para ver as continuações ou os vídeos no agora somente dispensário de lixo e spoofs YOUTUBE. Ou que lá, como alternativa, procure algo do nosso velho amigo Glauber, pois o cinema está em transe com sua tropa. Verdade revelada de um filme velado. Verdade desvelada de um mundo representado.

O dia em que Adorno e McLuhan sentaram para ver o BBB

Herbert Marshall McLuhan (1911-1980) se referia vez ou outra a televisão através da expressão “sala de aula sem paredes”. Para o autor, a televisão era um mosaico (uma tela pontilhada) que convidava os sentidos a interagirem e a mente a coletivamente conectar-se. Entusiasta dos meios eletrônicos e profeta das novas mídias, McLuhan não assistiu a explosão dos reality shows na televisão.


Theodor Wiesengrund Adorno (1903-1969), uma das principais vozes da Escola de Frankfurt, negava qualquer possibilidade dos meios eletrônicos estimularem a emancipação do homem. Para Adorno, a televisão possuía uma função, sobretudo deformativa. A rubrica Indústria Cultural, cunhada por Adorno ao lado de Max Horkheimer, colocava a televisão em meio a outros produtos culturais pautados pela produção em série. O sério pensador alemão também não assistiu a explosão dos reality shows na televisão.


Em um momento duplamente crucial na história do veículo televisivo no Brasil: a entrada em cena do modelo digital e a criação de uma TV realmente pública, a rede Globo de televisão estréia mais um BBB. O que McLuhan e Adorno, antagonistas de pensamento, teriam em comum em suas leituras sobre o veículo nos dias de hoje seria a eterna preocupação com a porção educativa da televisão. Como educadores não podemos nos calar com mais uma estréia de um reality show. Fenômenos como esses oito grandes irmãos atestam a necessidade que temos de pensar ainda o veículo. Em tempos onde de longe sentimos que o meio é a massagem, a indústria da cultura ainda dá as cartas. Contra a parede ou no paredão, o BBB pode ser a mensagem para quem ensina.

Não nos preocupemos um instante com audiência, moralismos ou qualquer questão de ordem estética. Pensemos um minuto somente na possibilidade que o veículo ainda possui e como um exemplo - somente um - pode contribuir, através de sua negação, para levarmos a televisão a sério como brilhantemente nos convidava, por volta dos 2000, Arlindo Machado. No livro “A televisão levada a sério” (Editora Senac), Machado explica brevemente as teorias de McLuhan e Adorno e faz uma opção em não ficar com nenhuma das duas, e sim pensar a questão do repertório. Talvez tenha chegado a hora de pensarmos, entusiastas ou demolidores, apocalípticos ou integrados de forma conjunta. Se pudéssemos, devíamos sentar com McLuhan e Adorno para não somente darmos uma “espiadinha” como somos conclamados pelo programa Big Brother Brasil. Mas ir mais além dos olhos, e realmente analisarmos a situação da TV em terra brasileira.

Daí não mais uma Verdade, mas uma provocação adorniana e mcluhaniana pode surgir para a sociedade da informação. Professores que usam o BBB como exemplo do que a televisão não deve ser. Educadores que, através do reality show, discutem como o mesmo meio que cria programas de vanguarda como o Abertura, o Roda viva e o Recorte Cultural, para citarmos três, pode aceitar seus BBB’s. Que a sociedade leve o programa pras suas discussões e transforme esse produto serializado em lição de uma sala de aula sem paredes, que não pode ser esquecida em nenhum momento. Para que não haja mais um irmão da novílingua BBB. Mas para que a forma TV informe e forme um novo cidadão que se pudesse escolher entre ver ou não ver optaria por manter os olhos fechados.