sábado, 11 de outubro de 2008
terça-feira, 7 de outubro de 2008
c'EST LA VIE
Se ela não viu
Se ela não ouviu
“Uma canção bonita falando da vida em ré maior”
C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não sorriu
Do “penso logo existo”, da besteira maior
C’est l avie ih
Que a vida é um bquadro sustenido em tom menor
C’est la vie
Que a vida é vã filosofia e viver é bem melhor
O mundo é um mapa de outro mundo
O mapa é o mundo
A vida é a história de outra vida
A vida é um mundo
Diante de um abismo tão profundo
Eterno segundo
Em frente seguir só livre pra sempre
Pra arder a mente
A árvore é já semente
C’est l avie
Que a vida é um bquadro sustenido em tom menor
C’est la vie
Que a vida é vã filosofia e viver é bem melhor
C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não ouviu
“Uma canção bonita falando da vida em ré maior”
C’est la vie
Se ela não viu
Se ela não sorriu
Do “penso logo existo”, da besteira maior
sábado, 20 de setembro de 2008
domingo, 24 de agosto de 2008
Dois atos...
Hoje (algum tempo atrás) pareci encontrar no discurso religioso um ato que me interessou. O eterno retorno do discurso religioso, da vigília sobre si próprio. Não o fato de a missa ser para mim como desejava meu pai, meu bom pai. Não o fato de ter participado da homilia lendo a carta aos hebreus no seu momento mais de-cisivo. A escolha de Abraão que eu tinha lido através do Kierkegaard e não através da bíblia. Leituras... Mas algo que fazia atuar e algo que em mim através do discurso me encantava. Talvez pelo padre ser extremamente sedutor, talvez por estar conectado aos meus estudos - era uma missa em ação de graças devido ao término do mestrado. Ao menos meu pai gostaria que assim o fosse. McLuhan era profundamente religioso, A igreja, certamente não, a prece, sim para ele devia ser o meio.
Não adianta, igreja é o local das culpas. Ali a culpa dos meus atos aparecia. Ali a culpa de pensar no filme de anteontem e no sexo com ela que ficara deitada em minha casa se tornava culpa. Culpa de só me interessar de fato por isso. Por dois atos. Em dois atos a peça da minha vida se dá. Pois o que não é sexo é cinema e às vezes até o sexo é cinema e o cinema é sexo. Ela me leva sempre para outro lugar. Sorrio.
A melhor motivação disso tudo, além de estar escrevendo novamente por mim e não pelos outros, é a idéia de descobrir mais sobre um terceiro ato. Que sempre soou como o grande discurso... E como temos medo dos grandes discursos nos apequenamos no ateísmo pequeno burguês ou no fervor de falar em nome das religiões...
Palavra da salvação. Quando salvação já é uma palavra... Vontade de rever o Evangelho do Pasolini...E o Dias de Nietzsche em Turim.... Vontade de dar um curso sobre cinema e religião... Vontade de invadir aquele quarto onde ela inda dorme e tirar o pecado do mundo...
Saudades do Pai. Mestre foi você que na simplicidade, no bom coração, na devoção não se ligava nos discursos. Agradecimentos muitos, ainda algumas culpas, dores, aflições... Angústia como a de Abraão.
quinta-feira, 10 de julho de 2008
quarta-feira, 25 de junho de 2008
Um dia sem você ( Ao Daniel )
Um cozinheiro sem tempero
Um criador sem idéias
Um músico sem instrumento
Um balão sem ar
Um dia sem sol
Um chopp sem colar
Um filme besteirol
Um sentir sem tocar
Um despertar sem olhar
Essa banda sem rock
Um tiro sem morte
Um dia sem amar
Um violão sem corda
Um carro sem pneu
Uma sopa sem colher
Um rugido sem som
Um ano sem dezembro
Um banho sem chuveiro
Uma planta sem semente
Uma fada sem duende
Um aperto sem mão
Uma queda sem chão
Um anel sem dedo
Um sangue sem vermelho
Um beijo sem boca
Um jantar sem louça
Um quebrar sem consertar
Um grito sem berrar
Um namoro sem sarro
Um lixo sem saco
Um espaço sem vácuo
Um gole sem cachaça
Uma piada sem graça
Um livro sem final
Uma roupa sem varal
Um Garrincha sem mané
Uma arca sem noé
Uma criança sem pirraça
Um truco sem trapaça
Um natal sem noel
Um horizonte sem ceú
Um embrulho sem papel
(Uma) Pelada sem Daniel
Um receber sem dar
Um amor sem cuidar
Uma paixão sem amar
Um doce sem engordar
Uma doença sem dor
Um Arlequim sem Pierôt
Um Godard sem Truffaut
Uma pastilha sem sabor
Um recreio sem bola
Uma memória sem escola
Uma direita sem esquerda
Uma esquerda sem direita
sexta-feira, 30 de maio de 2008
O significado de maio de 68
1968 começa antes e vai além de maio. É um processo e não um momento. Mesmo na França, os significados de Maio de 68 são variados: havia a revolta dos estudantes contra um sistema acadêmico burocratizado, havia a mágoa das esquerdas contra o presidente Charles de Gaulle pela violenta repressão na Argélia, havia um protesto dos cineastas contra o ministro da Cultura pela demissão de Henri Langlois da Cinemateca.
Nos Estados Unidos, a rebelião foi alavancada pela reação à guerra no Vietnã. Na Europa Oriental, o protesto à derrubada da Cortina de Ferro imposta pelo estalinismo. E no Brasil a rebelião visava a ditadura militar que, em quatro anos, já colocara dois presidentes no poder e ameaçava eternizar-se.
Em cima das rebeliões políticas encadeadas produziam-se contestações sociais, sexuais e culturais. Duas décadas depois do fim da Segunda Guerra Mundial e da falsa paz representada pela Guerra Fria, o mundo ocidental queria mudar.
1968 foi um gigantesco impulso para mudanças setorizadas. Hoje, 40 anos depois, as novas gerações não conseguem entender exatamente o que aconteceu, nem conseguem colocar-se diante das transformações que sobraram. É possível que o vulcão já esteja novamente em erupção e ainda não percebemos, é possível também que as conquistas de 1968 tornaram nosso sistema ainda mais rígido e inflexível.
Alberto Dines
Editorial do programa Observatório da Imprensa na TV, exibido em 27/5/2008
quinta-feira, 29 de maio de 2008
terça-feira, 27 de maio de 2008
Mostra 40 anos de maio de 68
10h - Os Sonhadores,
DIRETOR BernardoBertolucci
19h - Terra em Transe,
DIRETOR Glauber Rocha
27/05
12h - A sociedade doespetáculo,
DIRETOR Guy Debord
18h - A insustentável leveza do ser,
DIRETORPhilip Kaufman
28/05
12h - Teorema,
DIRETOR Pier PaoloPasolini
19h - Sympathy for the devil,
DIRETOR Jean-Luc Godard
29/05
12h - O Bandido da luz vermelha,
DIRETOR RogérioSganzerla
19h - Oliver,
DIRETOR Carol Reed
30/05
12h - Partner,
DIRETOR BernardoBertolucci
19h - Partner,
DIRETOR BernardoBertolucci
Algumas sessões serão seguidas de debate
terça-feira, 13 de maio de 2008
Bens de arquivo
Os arquivos dispensavam muito método. Nem com meus próprios vídeos - que hoje em dia com os dvd's devem beirar os 2000 títulos - conseguia classificá-los. Eles me classificaram. Me classificavam e classificam até hoje. Sem perceber novamente me tomaram e pediram: Estude-nos. Pareciam dizer os arquivos. "O que sou eu do lado de cá", perguntavam as pinturas de Klee ... O que guardam em mim, o que guardam de mim? Perguntam os arquivos a memória.
quinta-feira, 8 de maio de 2008
Mal de arquivo
A mente vagava e sorria pedindo mais
Pra não lembrar nada, além do sol e do mar.
Coisas que na memória a gente tende a guardar
Arquivar o que te faz sonhar
Registrar, pra não mais lembrar
Foi tarde da noite, num dia sem muito som
As horas passavam em busca de frases no tom
Livros sobre a mesa, fotos, quadros sem cor
Coisas que a música tende a compor
Arquivar o que te faz sonhar
Registrar, pra não mais lembrar
Ah! Foi de manhãzinha, lembramos então.
Um poema dizia “A memória é uma ilha de edição”
Ninguém duvidava soava tão bem
Aí alguém lembrou que esquecer faz tão bem
Arquivar o que te faz sonhar
Registrar, pra não mais lembrar
sexta-feira, 2 de maio de 2008
Nietzsche em 2 tempos: Por Münch e por Dioniso
"O nosso conhecimento exterior da arte é, no fundo, absolutamente ilusório, porque ao possuirmos tal conhecimento, não nos sentimos unidos e identificados com esse princípio essencial que, criados único e espectador único desta comédia da arte reserva para si o prazer eterno. Só no ato da produção artística,e na medida em que se identifica com o artista primordial do mundo, é que o gênio poderá saber algo da essência eterna da arte: porque só então,como por milagre, se tornará semelhante à perturbadora figura lendária que tinha faculdade de voltar os olhos para se contemplar a si própria; o gênio será então objeto e sujeito ao mesmo tempo, será simultaneamente poeta, ator e espectador "
quinta-feira, 1 de maio de 2008
11:11
São 11 e 11 e tudo mudou
acordes não surgem com tanta facilidade
Escrevem por mim na terceira pessoa
Pedem que corra... Zelam por não ter moral
Além do bem, além do sal
Leio a cartilha do irracional
Pois de razão já estamos legal
E de tanta rima passei tão mal... Fui de mau a melhor
Lambe o bigode. Esquizo tu tá
Cheira teu corpo que os órgãos se foram
Morde o sinal fechado em tua casa
Anda de lado ...se move que para. Sempre concordei que pensar é andar. Andamento
Só não diga que certo tu és
Nem com quem andas nem de onde vens
Não jogue ainda seus dados, seus dardos não ferem
Nem olhe bem nos olhos de ninguém
São 11 e 11 e nada mudou
o curso do rio tem outra dificuldade
Oram por mim e por outra pessoa
Torcem que morra... Trazem seu enfermo portal
Aquém do zen, aquém do tao
Aqui e sempre tudo é passional
Pois sem razão festejo o banal
E de tanta festa perdi o sinal.... Fui da cama ao Laos.
Atira no pé;. Esquizo ta tu
Chuta o santo que os deuses se foram
Avança o sinal aberto na tua rua
Rouba o mendigo... Esfrega ( a lama e o caos) na cara
Só não diga que certo tu foi
Nem com quem andas nem de onde veio
Jogue agora seus dados, seus dardos me ferem
Olhe bem nos olhos desse alguém que te faz rir
domingo, 27 de abril de 2008
Cinema dos sonhos: A propósito do longa " Cidade dos Sonhos", de David Lynch
Cena 1- Cidade dos sonhos é um filme que definitivamente deve fazer a crítica cinematográfica se perguntar sobre a sua função. Se o cinema, como aponta Gilles Deleuze em seu ‘Conversações’, “não tem necessidade alguma da crítica para encher as salas nem para preencher sua função social”, Cidade dos sonhos pode atestar essa consideração. Ou mais, pode lançar um verdadeiro desafio a quem deseja refletir criticamente sobre o filme. Como interpretar o sonho da cidade construída por Lynch? Para se ler, para se interpretar uma cidade precisamos da invisibilidade. Calvino mapeou as cidades invisíveis. Lynch filmou-as. O nome do filme original “Mulholland drive” não remete a cidade, mas a estrada. O nome do filme em português é metáfora pura.
O filme que nasceu de um projeto inacabado acaba por fazer qualquer crítico ou curioso por cinema se perguntar sobre o seu sentido. Acaba por acabar com a crítica institucionalizada que invadiu o cinema. Uma metanarrativa sobre o cinema. O paroxismo da abstração. O choro da morte da atriz no clube Silêncio. Uma radiografia da indústria cultural. Uma ode a fenomenologia da percepção. Afirmações que, em vão, tentam dar razão ao universo onírico de Lynch. Razão? "Me chama razões..."
Plano 2- Histórias. Entender o filme da forma que quiser, recomenda a atriz Naomi Watts. De acordo com as histórias que se envolver. Sentir a história pode ser a constatação do movimento que nos propõe Lynch. Ao relacionar o cinema com a “epifania do sensível”, André Bazin evidencia a arte que desvela o lado profundo e oculto do mundo. Cidade dos sonhos parece comprovar esse despertar para uma arte que fala de fato a interpretação livre da emoção. e que o cinema de Lynch vem de longe tentando indicar.
Contra-plongé -Imagens. Escrever sobre as imagens desse filme é um desafio, tal como compreendê-lo. Além de planos belíssimos gostaria de destacar as imagens tremidas e borradas para evidenciar os sentimentos, e mais, para mostrar a confusão dos personagens no mundo dos sonhos, na cidade chamada cinema. O diretor logo na abertura do filme abusa do poder da imagem. A dança que dá início ao longa não mostra só talento do também coreógrafo Lynch, mas brinca com a imagem e suas nuances de tal forma que aponta caminhos para a compreensão do sonho que o diretor nos convida a experimentar. Compreender o cinema, através das imagens de Lynch é tentar compreender os desafios do imaginário nos dias de hoje.
Luz, câmera, ação -Sons. No hay banda, mas há um Roy Orbison, sempre. O Clube do silêncio é um clube de lágrimas. I will be crying... Se em "Veludo azul", Lynch já demonstrava sua reverência a um dos maiores da música pop, em “Cidade dos sonhos” isso é defintivo.
no hay espectador- O cinema dos sonhos que o filme nos apresenta simboliza a urgência de uma arte voltada com a liberdade do autor, aponta para um novo diálogo que o fazer cinematográfico precisa estar imbuído. Quebra-se mais uma vez a linearidade. Parte-se o veio aristotélico que consagrou as narrativas, mas que aos poucos foi redefinindo-se. Aristóteles classifica. Vive-se o estado da “metafísica de artista” que Nietzsche pensou. Lynch experimenta.
"Cidade dos sonhos" parece funcionar como uma passagem, como um entre cinema que busca na relação autor/público uma nova forma de dialogar com a verdadeira função da arte: precipitar os sonhos. Esquecer a crítica. Essa, sobretudo. Silêncio
quinta-feira, 24 de abril de 2008
Memória. Algumas datas são reais, outras de minhas memórias
1- "A memória é o espelho em que vemos os ausentes. "( Joseph Joubert )
terça-feira, 22 de abril de 2008
Aforismo
"Aforismo significa explicar o que é Aforismo em poucas palavras" - Tharley Mota
α- Todos os verbetes da wikipedia;
β- Estilo de pensadores de vanguarda;
γ- Maneira encontrada por Friedrich Nietzsche de implodir a moral cristã, o Estado, Sócrates, Descartes, Kant e cia;
δ- Maneira encontrada por Friedrich Nietzsche de dizer que "graças à música as paixões possuem a si mesmas"
ε- O texto de Cool memories, de Jean Baudrillard;
F- No princípio era o aforismo;
ζ- Pensamento sinuoso, espiral, assintótico como a letra zeta do grego;
η- Meu primeiro aforismo: "Não se pode precisar ao certo, mas evidentemente Adorno entrou em algum shopping center brasileiro e presenciou um espetáculo que lhe abriu um largo sorriso (embora fazer sorrir não seja sua função). As lojas não tinham nomes em inglês como de costume, o chão não estava perfeitamente encerado e os rostos não estavam embasbacados pelo consumo. Os nomes estavam pichados, o chão enlameado e os olhares diziam pouco. Nas salas de cinema os heróis saíam das telas desiludidos, pois não havia público, nas escadas rolantes ficavam presos os sonhos de quem pretendia abrir uma nova loja, ou comprar o mais novo cd da banda criada no programa de televisão. Nas praças de alimentação distribuía-se comida a quem sentia fome e uma banda tocava uma marcha fúnebre. Néstor Garcia Canclini ao cunhar a expressão “o consumo serve para pensar” pode não ter levado em consideração que alguém como Adorno iria um dia a um shopping center." ;
θ- A poesia é a arte do aforismo;
ι- Algumas piadas como essa: Satanás não agüentava mais ter que aturar Karl Marx no inferno. Era o tempo todo aquela história de diabos exploradores contra diabos explorados. E toma O Capital, luta de classes, o Demo já tava por aqui. Resolve, então, ligar para o céu e pedir para Deus ficar um pouco com o Marx lá. Deus topa. Passa alguns dias, Satanás liga novamente para saber como vão as coisas. Quem atende é São Benedito. - Alô, São Benedito? Aqui é Satanás. Me chama o São Pedro aí pra me informar como é que Deus tá se virando com o Marx no céu. - Em primeiro lugar, caro Satanás, me chame Camarada > Benedito. Em segundo, o Camarada Pedro está em greve. E em terceiro, Deus não existe!
quarta-feira, 16 de abril de 2008
Epifania
2- Alguns blogues
3- Mais que imagens; sensações
4- Luz que rompe com as luzes
5- Aparições
6 - Alguns fantasmas como a escrita...
7- Os publicitários tentam através do brainstorming, raramente tendem a conseguir, mas quando isso acontece...87,64% dos jornalistas desconhecem a palavra.
8- Os artistas começaram a achar que ela era dispensável... Adorno criou o termo Indústria Cultural
9- Do grego πιφάνεια...
10- Sonho dos gregos pré-socráticos. Platão era um homem sem epifanias, daí suas aporias...
domingo, 6 de abril de 2008
Classificações
Michel Foucault em “As palavras e as coisas - uma
arqueologia das ciências humanas”, cita um texto de Borges sobre “uma certa enciclopédia
chinesa” que clasifica os animais em:
" a) pertencentes ao imperador, b) embalsamados, c)
domesticados, d) leitões, e) sereias, f) fabulosos, g) cães em liberdade, h) incluídos na presente classificação,
i) que se agitam como loucos, j) inumeráveis, k) desenhados com um pincel muito fino de pêlo de camelo, l) et
cetera, m) que acabam de quebrar a bilha, n) que de longe parecem moscas”.
Esse fragmento, que eu nunca li diretamente em Borges, me inspira pra compor - aqui no blogue - uma série de fragmentos sobre algumas definições que me compõem há algum tempo. Nunca pensei, incicialmente, que meu blog me permitisse (me permitam pensar 10 mandamentos da Ponte sobre o abismo): 1) expor minha intimidade; 2) classificar as palavras e coisas que gosto; 3) de forma inumerada; 4) traduzir meus agitos e minhas loucuras; 5) acreditar fielmente que: só existem traduções; 6) a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, k, l, m, n; 7) 8; 8) 8,1 - 8,2 - 8,3 - 8,4 - 8,41 - 8,42... (série de números); 9) classificar qualquer coisa; 10) que a cada dia do mês que completo trinta anos listasse, marcasse, arquivasse...
A primeira palavra da minha enciclpédia chinesa, com dedicatória de Borges e prefácio de Michel Foucault:
Utopia - do grego ο, "não" e τόπος, "lugar". Aquilo que não tem lugar, não-lugar, sonho.
a) também, segundo alguns, aquilo que não tem lugar ainda, sonho que não aconteceu, ainda; b) todos meus pensamentos; c) compreender Borges, sem Foucault; d) e vice-versa; e) os mandamentos da ponte sobre o abismo; f) todos os lugares; g) as músicas instrumentais; h) os filmes mudos; i) fuga; j) acreditar que não há um minotauro no labirinto; k) pensamento (que, em algum idioma quer dizer, o que não tem lugar),; l) heterotopias; m) o capital; n) o comunismo (inclusive, onde ele ainda sobre-vive).
domingo, 30 de março de 2008
SOMOS quando TRANSITAMOS
entre a memória e o orgulho
entre o devir e o tolo
entre "o animal que logo sou" e o "penso logo existo"
entre o e e o ou ( que sempre nos faz Ou ou E)
entre o filho e o pai
entre as convicções e os paradigmas
entre "o eu é um outro" e Eu
entre Sócrates e Nietzsche
entre o penalti e o goleiro
entre a linguagem e a falta dela
entre a música e as paixões
entre o meio e a mensagem
entre a infância e a velhice
entre a tudo que chega e a tudo que sai
entre o perjúrio e a promessa
entre "o rio que entramos e não entramos" e a "univocidade do ser"
entre a borda, a margem, a assíntota e o centro, o dentro, o fora.
entre o clássico e o moderno
entre o barroco e o abstrato
entre o som e a fúria
entre o ícone, o índice e o símbolo
entre os toques no teclado e as imagens na tv
entre Hollywood e o filme queimado
entre Eros e Tanatos, mas também entre ratos, lobos, armadilhas, usinas inteiras
entre guerras e mães
entre a mão e o córtex
entre a informação e a comunicação
entre as palavras e as coisas
Somos, fomos ou seremos ... Arquivos
domingo, 23 de março de 2008
Para Jean Budrillard: a acidez que educa
O real nasceu da falta de imaginação
A imaginação do pensamento é mais preciosa que o próprio pensamento
Entrei em contato pela primeira vez com um texto de Jean Baudrillard em 2002, ainda com a dúvida se a opção pela carreira acadêmica tinha sido a mais acertada. Estava ainda em um curso de graduação, após ter abandonado dois outros, e tinha como horizonte a vida na Universidade. O livro era “Cool memories IV” e alguns de seus aforismos – cito dois aqui – me convenceram que sim; que fazer jornalismo para dar aulas seria minha grande decisão em uma sociedade pautada pelo consumo, pelo excesso de comunicação, pelo simulacro. Temas recorrentes do texto do pensador francês me ajudaram, ao lado de outras provocações de sua ácida escrita a enfrentar o dilema proposto pela educação. Baudrillard com seu tom provocativo convida-nos educadores a uma discussão séria sobre as escolhas de quem ensinamos nas sociedades dos diversos rótulos - e longe de uma vocação educativa.
O primeiro daqueles aforismos bem curto dizia: “A ordem social nos ensina a calar, mas não nos ensina o silêncio”. Dele, o impacto de que, apesar dos pesares, temos voz. Primeira dúvida naquele momento, como usá-la? O segundo, um pouco maior, diz respeito às referências do autor. Ambos se encontram no livro citado, lançado no Brasil pela Estação Liberdade. O volume de número IV completa a série de suas “memórias frias”. Reproduzo então o outro aforismo.
“Cito somente aqueles que admiro porque souberam dizer melhor do que eu o que eu queria dizer. Ou o que sinto que poderia escrever. É como declinar nosso pensamento por meio de outra pessoa, que o restitui, como se nós o tivéssemos dado a ela. Que ele tenha sido pensado antes, que tenha sido pensado melhor é então um sinal compartilhado, um sinal predestinado, como um objeto que se oferece ao objetivo. Esse prazer da citação é portanto extremamente raro, e assim deve continuar a ser”.
A citação anterior nos coloca, escritor e leitor, no real objetivo dessas linhas: Baudrillard e as referências nos colocam em movimento. Aqueles que nós admiramos nos colocam em movimento. O pensamento é um movimento. Ensinados a não calar, e sim a explorar o legado da teoria crítica que Baudrillard não abria mão –e que qualquer outra também não pode fazê-lo no contemporâneo- pensamos e homenageamos aqueles que nos movimentam a pensar . Escrevemos sobre aqueles que admiramos, pensamos com aqueles que nos formaram. E nesse mover-se entramos em contato com uma ação. Embora o apocalipse dobrasse as linhas do texto de Jean Baudrillard, sua busca e produção incessante por respostas são saudáveis influências. Pra quem ensina e pra quem aprende.
Pelo percurso, evidentemente, encontramos exageros, mas o que seria do movimento do pensamento se não beirasse o excesso. O que seria da guerra se não fosse sua mídia. O que seria do cinema se não suas influências. Os irmãos Wachowski, diretores de “Matrix”, assumiram publicamente a influência de Jean Baudrillard na concepção do filme, embora Baudrillard diga que os autores não entenderam bem suas teorias. Ficou o excesso. Na tela, o livro “Simulacros e Simulações” guarda os programas do Hacker Neo, personagem de Keanu Reeves, e no exagero hollywoodiano ganhou o pensamento. O filme é parada obrigatória de diversos cursos de filosofia, por exemplo.
A imaginação do pensamento, os excessos do pensamento, a influência do pensamento. Três lições de vida para continuar a se descobrir Jean Baudrillard... Se não bastar, nas palavras do próprio em “A ilusão vital” (2001) uma provocação em tempos de clonagem: “ Mas se a vida é preciosa, é justamente porque ela não tem valor de troca – porque é impossível trocá-la por algum valor final”. Na sociedade das trocas, ‘baudrillar’ é preciso....
O sociólogo francês Jean Baudrillard morreu em Paris em seis de março de 2007 aos 77 anos.
terça-feira, 18 de março de 2008
Nossa Casa
A nossa casa não é nosso lar, a nossa casa tem na esquina um belo bar
pra saciar a fome de quem não tem
um amor
A nossa casa não é nosso lar pra brindar com aquele amigo, como é que vai?
A nossa casa sempre tá em pé
A nossa casa não é minha e tua
pois você não vê a graça
E um grito desesperado me faz pensar que a nossa casa é de um porto, o cais
domingo, 9 de março de 2008
Estéticapolítica
estetização da política,
como a pratica o fascismo.
O comunismo
responde
com a politização da arte"
(Benjamin, W.)
sábado, 8 de março de 2008
Sonho, técnica, sensação. SURROUNDED
quinta-feira, 6 de março de 2008
sábado, 1 de março de 2008
Artes e pessoas
cosmopolita
assim universal, assim sintética,
é evidente que nenhuma disciplina pode ser imposta, que não a de sentir tudo de todas as maneiras, de sintetizar tudo, de se esforçar por de tal modo expressar-se que dentro de uma antologia de arte sensacionista esteja tudo quanto de essencial produziram o Egipto, a Grécia, Roma, a Renascença e a nossa época. A arte, em vez de ter regras como as artes do passado, passa a ter só uma regra - ser a síntese de tudo. Que cada um de nós multiplique a sua personalidade por todas as outras personalidades."
“A única realidade da vida é a sensação. A única realidade em arte é a consciência da sensação."
"Eu era um poeta impulsionado pela filosofia, não um filósofo dotado de faculdades poéticas."
"Todos os meus escritos ficaram inacabados; sempre novos pensamentos se interpunham, associações de idéias extraordinárias e inexcluíveis, de término infinito.....................................O Caráter da minha mente é tal que odeio os começos e os fins das coisas, porque são pontos definidos."
COMUNIDADE E CIBERCULTURA: NOVOS DILEMAS DAS IMAGENS EM MOVIMENTO?
Algumas questões advindas com a tecnologia inauguram novos caminhos a serem trilhados por quem produz e consome cinema. Fenômenos na World wide web como as comunidades virtuais (Orkut, Myspace) e a nova sensação Youtube trazem à tona novas formas de se ler o cinema no contemporâneo. O próprio fazer cinematográfico também passa por interessante metamorfose, que novamente remete a pergunta sobre seu fim, mas que indica, sobretudo, novas possibilidades. Na denominação pós-cinema, novos conceitos são suscitados apontando para arte cinematográfica um novo mar, ou seria uma nova estrada de ferro? As imagens em movimento partem em seu trem para uma nova aventura. O trem parte da estação de Ciotat[1] rumo aos espaços da virtualidade. O mar da cibercultura é também cinematográfico.
O conceito de comunidades virtuais criado por Howard Rheingold e recortado por Henrique Antoun “considerava as comunidades virtuais capazes de recriar o tradicional sentido de participação e envolvimento das antigas comunidades, constituindo uma revitalização da esfera pública e social”[2]Pensar o envolvimento da arte cinematográfica com o ciberespaço para entender uma participação maior dos indivíduos em torno do esquecido rótulo Comunidade é dar novos ares ao cinema. Na história do cinema alguns movimentos já possibilitavam detectar essa relação. O neo-realismo, os cinemas novos e parte do cinema político não são reeditados com a internet, mas ganham novos contornos com a liquidez promovida pela interatividade e com alguma liberdade que o novo meio proporciona ao pensarmos na relação com a comunidade.
Não somente em termos de uma mudança em relação aos veículos existentes ou de reformulação, mas, sobretudo no que tange a uma nova concepção de fazer comunicação, vínculo entre os sujeitos, deve ficar o pensamento comunitário e sua relação para com o cinema. Coloca o filósofo da desconstrução, Jacques Derrida, pensando um novo Estado sob a égide das novas tecnologias.
Um estado virtual cujo lugar fosse um site da internet, um Estado sem solo, seria –eis a questão que nos orienta _ um Estado intelectual? Um Estado cujos cidadãos fossem essencialmente intelectuais, intelectuais enquanto cidadãos? Uma questão de ficção científica? Não acredito de modo algum[3].
O próprio virtual redesenha, e o pensamento sobre a comunicação tenta redefinir muitos conceitos, a relação do sujeito contemporâneo com a nova tecnologia da informação e da comunicação em rede. Um estado sem solo na internet mediado pelas questões das imagens em movimento também não nos parece questão de ficção científica. Em meio a esperanças democráticas, mudanças na subjetividade, interatividade e uma virtualização da realidade, o cinema pode ser pensado ainda como o meio que une o fantástico ao tecnológico, mas que acima de tudo traduz de forma poética os anseios de um mundo melhor. Como coloca Deleuze, o cinema é algo que nos faz crer nesse mundo.
[1] A referência aqui é ao primeiro filme mostrado ao público dos irmãos Lumiere “A chegada do trem à Estação Ciotat” (Arrivée d´un train in gare à la Ciotat, 1895).
[2] Henrique Antoun, O poder da comunicação e o jogo das parecerias na cibercultura, XIII Compós, p.3
[3] Jacques Derrida, Papel máquina, São Paulo, Estação liberdade, 2004. p. 214
terça-feira, 26 de fevereiro de 2008
Sobre um ano atrás em sua casa
O intuito desse artigo é propor o que a grande imprensa não vem fazendo de há muito: Explorar. Vasculhar o meio televisivo no sentido de discutir que por melhor que seja seu conteúdo é ainda a forma e os agenciamentos mediados por essa forma que dão as cartas. Esse desbravar se dá numa só noite. Que fique o exercício para os alunos dos cursos de Comunicação Social pelo Brasil espalhados. Que fique o exercício para os cidadãos que não mais apáticos somente assistem. Na terça-feira, dia 27 de fevereiro de 2007, a televisão brasileira dava uma aula sobre a relação apontada por McLuhan sem perceber. Ao mesmo tempo em que a TVE discutia com brilhantismo no seu “Observatório da imprensa”, a postura dos meios de comunicação, sobretudo o veículo impresso, diante do bárbaro assassinato do menino João Hélio, arrastado por ruas do Rio de Janeiro, a Rede Globo de Televisão exibia - com uma edição impecável - no seu Big Brother, o já famoso Paredão.
Enquanto convidados como o filósofo Renato Janine Ribeiro e a jornalista Tereza Cruvinel se empenhavam em pensar a relação entre a mídia e a violência e como pode a imprensa fazer algo para compreender as causas de tamanha crueldade, grande parte do Brasil se comovia com outra crueldade: aquela que dizem estar sendo cometida contra alguns participantes na casa do Big Brother Brasil e que serve para aliviar um pouco do sentimento de incredulidade que ainda ronda o povo brasileiro. De casa esse espectador tentava dividir sua atenção entre os dois canais e ainda dava parte de seu olho e corpo ao “Superpop” da REDETV, que exibia o imperdível debate com título parecido com “A maldição das novelas: os atores que sofrem a influência de espíritos malignos”.
No capítulo sobre a televisão do mesmo livro citado no início dessas linhas McLuhan dá a mensagem para explorar essa questão: “Acima de tudo a Tv é um meio que exige repostas criativas e participantes”. Cabe ao mesmo público que McLuhan menciona colocar o Big Brother no paredão? Será essa a alternativa? Que seja, sem problema. Mas não é única. Como meio e mensagem dialogam em uníssono, cabe ao público ainda um espasmo em nome de um meio que lhe interesse mais, já que pelo conteúdo belos programas como o da TVE aqui mencionado parecem cada vez mais relegados a um público muito específico e preteridos pelo “que o público deseja”. Unidos pela artimanha da indústria cultural precisamos cada vez mais reler McLuhan para entender o matrimônio entre meio e mensagem. Até que o Youtube os separe e possamos observar o que um outro meio pode fazer. Atento a televisão, McLuhan profetizava e rede mundial de computadores. A rede é a mensagem. Atentos ao Grande irmão - Globo ou qualquer outro produto da tv comercial brasileira - e a sua extensão impressa - Veja ou qualquer outro produto da mídia "pseudoindignada" - repensar os meios é tarefa de quem estuda os meios.
terça-feira, 19 de fevereiro de 2008
Cotidiano
A nicotina tem destes efeitos
Ficar a imaginar palavras perfeitas pra falar.
É muita Pressão.
Porque tudo é informação
O controle da vida não é o remoto.
O remoto da vida não é ter controle.
Quem quer pensar.
Pensar em algo para não se falar.
Então nada é cotidiano
As nossas vidas são só defeitos
Ficar a imaginar acordes perfeitos pra tocar
Na maior tensão
E graças à ARTE eu vivo paixão
A pintura da vida não é abstrata
O abstrato da vida não é uma pintura
Vamos borrar
o quadro, a tela de tanto tentar
É tudo. É nada. É cotidiano
Esquecer e lembrar de todos os feitos
Os dias são agitados, parados, perfeitos pra sonhar
Sem muita noção
Somos todos bobos da corte da população.
O crime da vida não foi tão perfeito
O perfeito da vida é mais que um crime
Pra querer tratar
cada pedaço em todo o espaço
como um traço, um laço pra nos amarrar.
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008
Cidades visíveis...
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008
ARCÁDIA
Medo ao caminhar
Vejo nessa gente
Um pranto a rolar
Da cidade fujo
Tento me esquivar
Dos golpes dos mundo
Do sofrer penar
Pra loucura corro
Sem nem mais pesar
Penso, existo,
Lembro de um lugar
Um lugar pra aproveitar
Um lugar pra aproveitar
Pra loucura corro
Sem nem mais pesar
Penso, existo,
Lembro de um lugar
Um lugar pra aproveitar
terça-feira, 5 de fevereiro de 2008
Música de imagens
segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008
CARTA ABERTA A JOHN ASHBERY
passante diz, em um estilo nonchalant,
e imediatamente apaga a tecla e também
o sentido do que queria dizer.
Esgotado o eu, resta o espanto do mundo não ser
levado junto de roldão.
Onde e como armazenar a cor de cada instante?
Que traço reter da translúcida aurora?
Incinerar o lenho seco das amizades esturricadas?
O perfume, acaso, daquela rosa desbotada?
A vida não é uma tela e jamais adquire
o significado estrito
que se deseja imprimir nela.
Tampouco é uma estória em que cada minúcia
encerra uma moral.
Ela é recheada de locais de desova, presuntos,
liquidações, queimas de arquivos,divisões de capturas,
apagamentos de trechos, sumiços de originais,
grupos de extermínios e fotogramas estourados.
Que importa se as cinzas restam frias
ou se ainda ardem quentes
se não é selecionada urna alguma adequada,
seja grega seja bárbara,
para depositá-las?
Antes que o amanhã desabe aqui,
ainda hoje será esquecido
o que traz a marca d'água d'hoje
Hienas aguardam na tocaia da moita enquanto
os cães de fila do tempo fazem um arquipélago
de fiapos do terno da memória.
Ilhotas. Imagens em farrapos dos dias findos.
Numerosas crateras ozonais.
Os laços de família tornados lapsos.
Oco e cárie e cava e prótese,
assim o mundo vai parindo o defunto
de sua sinopse.
Sem nenhuma explosão final.
Nulla dies sine linea. Nenhum dia sem um traço.
Um, sem nome e com vontade aguada,
ergue este lema como uma barragem anti-entropia.
E os dias sucedem-se e é firmada a intenção
de transmudar todo veneno e ferrugem
em pedaço do paraíso. Ou vice-versa.
Ao prazer do bel-prazer,
como quem aperta um botão da mesa
de uma ilha de edição
e um deus irrompe afinal para resgatar o humano fardo."
As lembranças eternas de um brilho que não mente
“Benditos os esquecidos, pois desfrutam até dos próprios erros”. É com essa citação de Nietzsche que a personagem Mary, vivida por Kirsten Dunst, refere-se a memória que vai sendo apagada dos personagens centrais de Brilho eterno de uma mente sem lembranças . Esse texto é um erro, talvez.
Em um filme onde uma história de amor, técnica, psique e criatividade se confundem, lembrá-lo uma vez mais é necessário. A relação do filme com autores como Nietzsche, Freud e Bergson é não só a tônica desse artigo sem muitas memórias, mas caminho para não esquecê-lo. Não é devido a quantidade de livros recentes relacionando a filosofia ao cinema que tentamos aqui compreender a e-ter-ni-da-de de ‘Brilho’. Talvez a reboque da questão de um outro filósofo - esse com os dois pés fincados sobre o cinema - possamos dar entrada no que propomos. Um dia a pergunta o que é o cinema será reformulada, advertia Gilles Deleuze nas considerações finais de sua segunda obra sobre a arte cinematográfica, ‘A imagem-tempo’. Em suma perguntar o que é o cinema será perguntar o que é o pensamento, percebe Gilles Deleuze.
Delueze nos liga ao filósofo citado no filme. Friedrich Nietzsche é um dos primeiros pensadores a perguntar sobre outros mecanismos para se pensar o pensamento. De Nietzsche, que pouco ouviu falar do cinema, ficamos aqui com um breve recorte da memória em tom sempre aforismático. “Fui eu que fiz diz minha memória. Não posso ter feito isso, diz o meu orgulho, e mantém-se irredutível. No final é a memória que cede” (NIETSZCHE, 2002). Essa observação nos facilita na compreensão de um todo que paira sobre o filme. No mesmo sentido da citação que aparece abrindo esse texto ( e que constitui uma da mais belas seqüências do filme) a memória é um fantasma entre o tolo e o orgulho. Essa observação do filósofo do Eterno Retorno é crucial nessa análise sobre a memória no filme. Querido Waly, realmente “a memória é uma ilha de edição”. Frase a qual o cinema deve agradecer todos os dias. Todas as horas em que o pensamento é cortado pelas imagens em movimento, pelo movimento das imagens-memória.
Por esse viés da memória e com a retomada dos estudos na Comunicação da leitura de Henri Bergson, ‘Brilho eterno’ é mais que atual. O entendimento que propõe Bergson acerca da imagem em ‘Matéria e memória’ reduz a um “entre” o destino manifesto da imagem cinematográfica. Coloca o autor
A matéria, para nós, é um conjunto de “imagens”. E por “imagem” entendemos uma certa existência que á mais do qua aquilo que o idealista chama uma representação, porém menos do que aquilo que o realista chama coisa – uma existência situada entre a “coisa” e a “representação” (BERGSON, 1999).
O ‘entre-roteiro’ de Charlie Kaufman (Quero ser John Malkovich, Adaptação, Confissões de uma mente perigosa, A natureza quase humana) é um dos melhores dos últimos tempos, não por sua narrativa não linear, não por sua poesia, mas por sua preocupação amorosa de fazer do relacionamento humano uma ponte entre esse conjunto de imagens. Não à toa as imagens remetem a escombros como o amor. A memória no filme é algo que desmorona. Matéria que solapa idéia e representação. Por que Clementine Kruczynski (Kate Winslet) resolve tirar o companheiro Joel Barish (Jim Carey) da memória é importante questão que fica escondida com a entrada em cena de sua resposta: “Bem aventurados os esquecidos”.... Errar, como canta Cristiano Lyra da banda Rizoma, é acertar. (Perdoem as minhas lembranças na hora de compor essa lembrança). É assim que ao receber um cartão dizendo que foi apagado da memória Joel decide fazer o mesmo e esquecer para sempre Clementine. Matéria e memória são elementos centrais desse apagamento. Fotos e desenhos dividem com canecas e coleiras de cachorro espaço para trucidar a memória. A narrativa do filme transpõe uma ordem puramente semiótica da vida. Ordem a qual o cinema sempre quis ser devedor.
Como propõe Freud: “Bastar-nos-á, pois, saber o lugar no qual encontrar a recordação assim fixada para podê-la reproduzir”, o filme tenta encarar esse fantasma chamado memória. Comparando-a com o chamado “bloco maravilhoso” – um brinquedo antigo que retinha o desenho e depois com um simples movimento da folha que o protegia apagava o que tinha sido desenhado – Freud não fazia idéia do que a criatividade de um roteirista e a sensatez da direção de Michel Gondry podem fazer a mente e ao coração de quem assiste a esse belo filme. Mas fazia, e muito, idéia de que a memória é algo de fantasmagórico. As personagens do filme transpõem uma visão psicanalítica de mundo. Visão que o cinema sempre quis ser devedor.
Entre erros, fantasmas e gênios Brilho eterno de uma mente sem lembranças nos coloca em um labirinto das memórias. Mas de nossas memórias. Dela vem a referência a um autor despercebido. Benoist nos ajuda com a tarefa mais difícil que tem um texto, seu fim.
Em suma, nada pode ser por nós compreendido que não evoque uma de nossas recordações. Nada podemos reconhecer sem antes conseguirmos aproximá-lo de um precedente conservado na memória. Os pensadores de todos os tempos repetiram-no incessantemente (BENOIST, 1975)
Uma última recordação: O trem saiu da estação de Ciotat para a estação de Montauk...A Cine-Memória do mundo é uma vida de trens, recordações e pensadores.
REFERÊNCIAS
Benoist, Luc. Signos, símbolos e mitos. Lisboa: Edições 70, 1975.
Bergson, Henri. Matéria e memória. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
Deleuze, Gilles. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 1995.
Nietzsche, Friedrich. Para além do bem e do mal. São Paulo: Martin Claret, 2002.
Freud, Sigmund. O bloco mágico. Buenos Aires: Amorrortu, 1925.
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008
FARSAS, FILMES E SETAS QUE DOBRAM
Como todas as farsas enrolo teu cabelo
Beijo teu cotovelo
O que queres de mim é me prender
Não me deixar te esquecer
Mas o que quero de ti já ficou pra trás
E essa noite não me fez o bem
Que há tanto tempo faz
Me refaz, te refiz
Eu sigo um caminho torto
A sua seta não me seduz
A reta me deixa preso a sua cruz
É a dobra que me mantém.
Como todos os filmes troca-se o rolo
O ator se faz de bobo
O que fazer se a platéia perceber
(o que não fazer)
Mas a continuísta entra em cena
Me leva pra outro lugar
Bem mais minha cara
Ao anoitecer, leveza do ser
Juliete Binoche ao amanhecer
Longe de ti
Perto de mim
Perto do fim
Longe de Quem?
Longe de mim
Perto de ti
Longe do fim.
Perto de Alguém.
quinta-feira, 31 de janeiro de 2008
RAZÕES
Paro em frente a tua casa que é tua sepultura
Sou cheia de sorrisos falsos
Repleta de boas intenções
Mas tudo o que eu quero é destruir tuas sensações
Tudo o que eu quero é combater tuas emoções
Por que me chamam razão
Me pedem razões
Me chamam razão
Me pedem razões
Eu tomo os livros da tua estante
Eu sei que nada será como era (como era antes)
Me finjo em poesias concretas
Pareço até os melhores estetas
Mas tudo o que eu quero é desvelar tuas sensações
Tudo o que eu quero é confrontar tuas emoções
Por que me chamam razão
Me pedem razões
Me chamam razão
Me pedem razões
terça-feira, 29 de janeiro de 2008
A imagem que pesa 21 gramas. O filme que pesa em nossas vidas. O peso da poesia cinematográfica de Alessandro Iñarritu e a questão do ser
impede-a de apreciar em seu justo mérito
as intenções mais esclarecidas”
‘O seio nu’
Ítalo Calvino-Palomar
No caso do filme, a imagem é responsável em todas as suas colorações por um convite ao retorno à discussão sobre a posição do homem diante do acaso, diante da limitação por esse imposta, diante da própria metafísica e, sobretudo, diante do outro. Obviamente não só a imagem poderia nos levar a pensar nessa concepção, ou como afirma Baudrillard em um belo aforismo
O conceito é irrepresentável, mas a imagem é inexplicável. Entre eles há, portanto uma distância irreparável. E por isso a imagem vive da nostalgia do texto e o texto da nostalgia da imagem ( Jean Baudrillard. Cool memories IV, São Paulo, Estação Liberdade. 2002 p. 8) .
Assim esse texto pretende analisar as imagens do filme de Iñarritu, pensando o conceito da morte que o texto traz e que o dispositivo imagético consegue captar de forma magistral. Do vôo das pombas em um céu azul a morte amarelada e cheia de vida do personagem Paul, vivido por Sean Penn, a concepção de uma nova vida, com a coloração branca da bela cena de amor entre os personagens de Penn e Naomi Watts, entra em cena a imagem do ser. A pergunta sobre o quanto se perde, ou se ganha com a morte desse "21 gramas" faz da nostalgia que Baudrillard propõe um sentimento verdadeiramente bom, um sentimento que somente a saudade poderia explicar e que propõe a nostalgia que o texto e imagem desse filme nos traz.
Os planos e a câmera, por vezes vertiginosa, por vezes delicada tecem com a fotografia uma combinação que "Amores Brutos", primeiro filme de Iñarritu, já dava conta. Técnica e estética como faces de uma mesma moeda, para usar expressão recorrente. Esse filme não poderia ser esquecido, pois a mesma questão envolvendo o ser parece estar nele desenhada. Amores brutos, que tem no seu narrador fora da história e no seu veio político um diferencial em relação a "21 gramas," possui a mesma preocupação com o ser. Fato que o cinema não esquece, mas que em alguns momentos se distancia.
Em "21 gramas", o diretor encara com a mesma naturalidade o desafio de contar uma história através de imagens que mesclam poesia e técnica para mostrar e comprovar que estamos realmente jogados no mundo, lançados no mundo como o movimento proposto na filosofia heideggeriana. É também no acaso das imagens e nas imagens do acaso, que o filme dialoga com a filosofia.
As cores - para ser mais exato, os timbres - dão vida ao filme de Iñarritu. Desenham verdadeiras peças, fotos, telas que fixam os olhos do espectador na história que, com um misto de dor/desejo/esperança, nos leva a refletir um pouco mais sobre a existência. Função que Carrière brilhantemente recorta sobre a sétima arte.
O cinema nos arrasta para fora de nós mesmos, retardando o movimento dos pulmões e do coração. É difícil continuar falando de realidade quando o que estamos fazendo é penetrar num corpo que não é nosso, num cenário que não é nosso (Jean-Claude Carrière. A linguagem secreta do cinema, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994, p. 75) .
Em "21 gramas", coração e pulmão são os órgãos que mais parecem simbolizar o que o filme se propõe. O ar e o amor são tratados com toda a dicotomia que merecem e os personagens Cristina e Jack, interpretados por Naomi Watts e Benicio Del Toro, emprestam seu fôlego e suas dores para dar brilho as imagens do filme. E se o corpo sem órgãos é realmente um limite como propõem Deleuze e Guattari se, a “ele não se chega, não se pode chegar, nunca se acaba de chegar” (Deleuze, Gilles. Guattari, Félix. Mil platôs Vol1, São Paulo, Editora 34, 2004, p. 9), vinte e um gramas parecem realmente ser liberados do corpo no exato momento da morte como gira a história desse instigante filme sobre a vida. A colocação de Carrière sobre a realidade que penetra em um outro corpo é redimensionada em alguns filmes contemporâneos que parecem mais reais que a própria realidade, seja pela vida que virou filme como aponta Neal Gabler, seja pela redefinição de realidade imposta pela virtualidade.
No filme, o peso das atitudes e as intenções precipitadas, motivadas pelo acaso dos acidentes impostos pela vida, ganham as explicações matemáticas de um professor, religiosas de um antigo perdido na vida - e temente em todos os sentido a Deus - e o desespero de uma mulher. As explicações tentam convencer-nos de que algo do inevitável poderia ter sido previsto, mas o destino que se cumpre também pode ser visto como crescimento. É aí que as imagens ganham sua força. Iñarriatu faz nascer das imagens uma nova concepção para os três mundos da diegese. Três histórias que se cruzam para imageticamente se encontrarem.
O filme que gira em função do acidente de carro que também faz três vítimas (um pai e suas duas filhas) salva a vida por alguns poucos meses do personagem de Sean Penn que recebe o coração do homem atropelado. Atropelos então começam a dar rumo às situações impostas pelas imagens captadas pelo diretor.
Para cada situação Iñarritu percebe uma câmera diferente, um olhar diferente. Do quadro pintado pelo rapaz que observa o acidente (em meio às folhas que cata e o som da frenagem do carro) à epifania da ida no veículo ensangüentado para o salvamento de uma vida que não quer ser salva, o filme parece tentar nos colocar juntos a intimidade da fragilidade da vida diante do acontecimento. Tal fragilidade é pintada com cores vibrantes. Com as nuances extremas que grandes pintores mostravam a vida e que poucos diretores de cinema conseguem ao lado de seus diretores de fotografia. Iñarritu consegue captar nas imagens colorações que dão clima em conjunto. Cores que remetem momento a momento, vale novamente lembrar, a problemática do ser.
Ao lado da cor, "21 gramas" coloca a angústia do homem no cerne da discussão. Faz isso com o belo texto do roteiro de Guillermo Arriaga. Faz o cinema distanciar-se da questão sobre seu aparato técnico e concentra-se no homem. No ser que reconhece sua finitude e que passa a conhecer o acaso. A preocupação do cinema de Iñarritu e de um grupo de pensadores-cineastas da atualidade nos leva a refletir sobre uma metamorfose que passa o cinema no mundo regido pelas novas tecnologias da comunicação e da informação ( esse próprio texto que publico aqui hoje, antigo em meus arquivos, renasce de outro filme que assisti por esses dias, o belíssimo Ballet mécanique (1924), de Fernand Léger. Um filme sobre a máquina que trata do ser, um filme experimental com um belo tema). Retomar, como propõe Burch a questão do tema de um filme não parece ser descabido em uma discussão como a que se tenta fazer nesse texto. Coloca o teórico:
Assim, se admitimos que o cinema, que já descobriu parte de suas potencialidades estruturais, deve considerá-las na escolha de seus temas, resta-nos perguntar “o que é um tema de filme”, ou, “o que é um bom tema de filme?” Ou ainda, “o que é um bom tema de filme hoje?” (James Dudley Andrew. As principais teorias do cinema – Uma introdução, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor 1989, p.49)
A epígrafe de Calvino - quando assisti "21 gramas" esse pintor de palavras não me saía da cabeça - que se apresentou como oportuna tenta dar conta da resposta às indagações de Noel Burch. Reler o homem e a moral como tenta "21 gramas" é observar com o senhor Palomar as intenções. Saber lidar com a intencionalidade nas decisões humanas como apresenta Iñarritu é compreender o peso morto que o homem parece estar se tornando, esquecendo o recado que ainda tenta o cinema lhe dar sobre a importância do ser no mundo que esquece dos acidentes, das cores, das imagens de verdade, em nome das infinitas reproduções, dos simulacros sem sentido da contemporaneidade. Falar do ser é falar de uma máquina...
Bibliografia
Andrew, James Dudley, As principais teorias do cinema – Uma introdução, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1989
Baudrillard, Jean, Cool memories IV, São Paulo, Estação Liberdade. 2002
Burch, Noel, Práxis do cinema, São Paulo, Perspectiva, 1992
Carrière, Jean-Claude A linguagem secreta do cinema, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994
Gilles, Deleuze. Félix, Guattari, Mil platôs Vol1, São Paulo, Editora 34, 2004
segunda-feira, 28 de janeiro de 2008
Extemporâneos....
Eu prefiro o outro àquele que finge clamar por morta sinceridade
não há nada que me faça mais feliz que um ano após o outro ( quanto um dia quando acaba)
Só um amigo correndo em linha reta apesar da vida de torto
Eu ainda prefiro meu jantar ao meio dia e um boteco de esquina
à ilusão dos falsos amores que relutam contra a verdade a dois
deixo para depois o trivial, o redundante e aquela palavra certa
que me pedem nas horas mais erradas. Acabo como sempre falando em demasia.
Pra todos que me amam e nada esperam em volta (pois pouco consigo dar)
também para aqueles que só me aturam, fingindo ou querendo gostar
a esses devo um pouco mais, deixo estar, para não confundir
mas não esqueço um dia sequer, mas sem sofrer
Daqui só levo quem quero, que dessa estrada de fim certo
nada fica, que dessa vida sem razão é melhor ficar com a sensação
mas também é bom ser ácido, sereno e até misericordioso. Um adorno,
pois de fé já me enchi e agora luto em ser apenas um bom repouso. Um samaritano
sexta-feira, 25 de janeiro de 2008
quarta-feira, 23 de janeiro de 2008
Recrutar a filosofia. Refazer a classe média
“Os direitos do homem são axiomas: eles podem coexistir no mercado com muitos outros axiomas, especialmente na segurança da propriedade, que os ignoram ou ainda os suspendem, mais do que os contradizem: “ a impura mistura ou o impuro lado a lado”, dizia Nietzsche. Quem pode manter e gerar a miséria, e a desterritorialização-reterritorialização das favelas, salvo polícias e exércitos poderosos que coexistem com as democracias? Que social democracia não dá a ordem de atirar quando a miséria sai de seu território ou gueto. Os direitos não salvam nem os homens, nem uma filosofia que se retorritorializa sobre o estado democrático. Os direitos dos homens não nos farão abençoar o capitalismo. E é preciso muita inocência, ou safadeza, a uma filosofia da comunicação que pretende restaurar a sociedade de amigos ou mesmo de sábios, formando uma opinião universal como “consenso” capaz de moralizar as nações, os Estados e o mercado” ( Gilles Deleuze, Félix Guattari, O que é filosofia?, São Paulo, Ed.34, p.139).
Essa longa citação encontrada no livro que pergunta o que é a filosofia nos convida para pensar os dias de hoje dos brasileiros. Não abençoamos o capital como grande parte dos formadores de opinião. Um fantasma ronda o Brasil, o fantasma da democracia. Governo do povo, sobre o povo. Democracia que nos permite hoje falar de liberdade da imprensa. Mas não falar para o cidadão. Um fantasma ronda o Rio de Janeiro: a classe média que necessita dos dois eixos da reflexão anterior: das esferas do estado: polícias e exércitos; do mundo da comunicação: imprensa e consumo. A opinião universal de que o Rio não vai bem das pernas elege agora mais um carnaval para deixar o estado respirar. A bela canção de Max Gonzaga, “Classe média”, embora retratando a violência urbana de São Paulo devia ser o hino do espetáculo contemporâneo e espelho da classe média, ou classe mídia carioca: “Aí a mídia manifesta a sua opinião regressa de implantar pena de morte ou reduzir a idade penal. E eu que sou bem informado concordo e faço passeata enquanto aumenta a audiência e a tiragem do jornal”. Meios e estados safados em busca de um consenso para melhor passar os dias.
sábado, 19 de janeiro de 2008
ENSAIO SOBRE A PERICULOSIDADE DA VERDADE NO CINEMA E SEUS ASPIRAS. OU PARA ENCERRAR A DISCUSSÃO ACERCA DE TROPA DE ELITE SOB A LÓGICA GLAUBERIANA
A polêmica em torno da obra de José Padilha revela o desconhecimento da verdade- com v minúsculo - da Arte. Justamente por tentar revelar a Verdade com V maiúsculo da realidade em termos hegelianos. Somos todos alvejados por balas de fotogramas. Somos capitãesnascimentomoura e alunos da universidade de cristo. Mas não pretendemos aqui de modo algum discutir o filme, exaustivamente analisado pelas mídias de massa e pelo próprio Padilha, mas, despertado por ele, trazer a baila algumas questões despercebidas pela crítica. Antes, uma pausa para a acusação do filme de fascista.
O neo-realismo italiano, movimento grandioso da história do cinema, tinha os pés fincados no regime de Mussolini e isso não foi problema para a corrente entrar na história como algo pra lá de libertário. Acusar de fascista a obra de Padilha é, no mínimo, não atentar para esse fato. A questão é que TROPADIELITI não inaugura nada de novo no cinema. Alertar é suficiente para arte ou sua função não é mais a de destruir como provocou Nietzsche? Troppaaaa não destrói, corrobora. Espetáculo puro pra Debord botar defeito.
Nem mesmo a discussão sobre a pirataria (que nada tem a ver com o filme) é nova. Cinema e pirataria sempre andaram juntos, pois piratas da perna de pau são os estúdios, os producers e seus delitos... Não inaugura, pois não é Arte. É comércio. Comércio de cópias e de Trajes do bope. Comércio de vídeos oportunistas e entrevistas do diretor. Trrrooppaa deve se pretender neo-realista, mas no máximo ele é clássico narrativo... Dialética e estética hegeliana.
Quanto as questões que não apareceram. Ficamos com pelo menos duas. 1- A figura do professor e sua aula em formato de seminários que assiste a apresentação de um Foucault que os foucaltianos devem desconhecer, que no quadro apresenta os nomes de Nietzsche (logo Nietzsche que revelava que graças a música as paixões possuem a si próprias - leiam cantando...”Tropa de elite osso duro de roer pega um pega geral também vai pegar você”....) e Deleuze (logo Deleuze que sempre estudou o cinema e as possibilidades de crença no mundo a partir da arte e que por isso cito: “O homem está no mundo como numa situação ótica e sonora pura. A reação da qual o homem está privado só pode ser substituída pela crença. Somente a crença no mundo pode religar o homem com o que ele vê e ouve” . É preciso que o cinema filme, não o mundo, mas a crença neste mundo, nosso único vínculo” - Gilles Deleuze, A imagem-tempo, São Paulo, Brasiliense, 1995, p.207.). A figura desse professor esquece seu papel para explicar o valor e não valor das instituições...
2 – O saco de gatos das ONG’s (ridicularizadas no filme e que ainda não se revoltaram contra isso) torna-se figura caricata como o personagem que a dirige, vivido de forma não tão caricata por André Mauro... A verdade da ONG de TROPADIELITI é apenas uma das verdades.
Que a crítica e Padilha não me perdoem por começar um texto como esse lembrando Hegel e por terminar conclamando a quem não assistiu, ainda, assistir Trrrrroooopà e depois correr para o comércio pirata para ver as continuações ou os vídeos no agora somente dispensário de lixo e spoofs YOUTUBE. Ou que lá, como alternativa, procure algo do nosso velho amigo Glauber, pois o cinema está em transe com sua tropa. Verdade revelada de um filme velado. Verdade desvelada de um mundo representado.
O dia em que Adorno e McLuhan sentaram para ver o BBB
Não nos preocupemos um instante com audiência, moralismos ou qualquer questão de ordem estética. Pensemos um minuto somente na possibilidade que o veículo ainda possui e como um exemplo - somente um - pode contribuir, através de sua negação, para levarmos a televisão a sério como brilhantemente nos convidava, por volta dos 2000, Arlindo Machado. No livro “A televisão levada a sério” (Editora Senac), Machado explica brevemente as teorias de McLuhan e Adorno e faz uma opção em não ficar com nenhuma das duas, e sim pensar a questão do repertório. Talvez tenha chegado a hora de pensarmos, entusiastas ou demolidores, apocalípticos ou integrados de forma conjunta. Se pudéssemos, devíamos sentar com McLuhan e Adorno para não somente darmos uma “espiadinha” como somos conclamados pelo programa Big Brother Brasil. Mas ir mais além dos olhos, e realmente analisarmos a situação da TV em terra brasileira.
Daí não mais uma Verdade, mas uma provocação adorniana e mcluhaniana pode surgir para a sociedade da informação. Professores que usam o BBB como exemplo do que a televisão não deve ser. Educadores que, através do reality show, discutem como o mesmo meio que cria programas de vanguarda como o Abertura, o Roda viva e o Recorte Cultural, para citarmos três, pode aceitar seus BBB’s. Que a sociedade leve o programa pras suas discussões e transforme esse produto serializado em lição de uma sala de aula sem paredes, que não pode ser esquecida em nenhum momento. Para que não haja mais um irmão da novílingua BBB. Mas para que a forma TV informe e forme um novo cidadão que se pudesse escolher entre ver ou não ver optaria por manter os olhos fechados.