terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Sobre um ano atrás em sua casa

Sou classe médiaPapagaio de todo telejornalEu acreditoNa imparcialidade da revista semanalSou classe médiaCompro roupa e gasolina no cartãoOdeio “coletivos”E vou de carro que comprei a prestaçãoSó pago impostosEstou sempre no limite do meu cheque especialEu viajo pouco, no máximo um pacote cvc tri-anualMais eu “to nem ai”Se o traficante é quem manda na favela (...) Mas se o assalto é em moema O assassinato é no “jardins”A filha do executivo é estuprada até o fimAi a mídia manifesta a sua opinião regressaDe implantar pena de morte, ou reduzir a idade penalE eu que sou bem informado concordo e faço passeataEnquanto aumenta a audiência e a tiragem do jornalPorque eu não “to nem ai”Se o traficante é quem manda na favelaEu não “to nem aqui”Se morre gente ou tem enchente em itaqueraEu quero é que se exploda a periferia todaToda tragédia só me importa quando bate em minha portaPorque é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida ( Max Gonzaga)
http://www.youtube.com/watch?v=3uR_nfu0yV0


O teórico da mídia Marshall McLuhan termina assim seu capítulo dedicado a imprensa na obra “Os meios de comunicação como extensões do homem”: “Os donos dos meios sempre se empenham em dar ao público o que o público deseja, porque percebem que a sua força está no meio e não na mensagem ou na linha editorial”. Tal afirmação enfatiza uma vez mais a máxima do autor de que “o meio é a mensagem”, que necessita ainda – e cada vez mais - de muita exploração para se chegar a qualquer explicação. Para lembrar, McLuhan era um otimista quanto ao veículo televisivo e o precursor de uma análise categórica sobre esse medium. McLuhan, que muitos consideram hoje também o arauto do pensamento sobre a internet, teria vasto material para suas análises nos dias de hoje. Sob a primazia do meio vivemos. Sob a confluência dos meios navegamos. Precisamos com urgência habitá-lo de outras formas. Essa outra forma passeia por aqui, pelos blogs, pelas possibilidades da rede. O texto que segue data de um ano e é mais uma vez uma crítica aos media. Cito novamente, e um ano atrás, o BBB. De uma terça-feira de 2007 tento pensar uma situação que parece não ter fim; poderia falar de ontem da entrevista de Steven Johnson ao “Roda Viva”, enquanto rolava mais um Big Brother, mas fico com um texto de um ano atrás, com a capa da Veja de um ano atrás para lembrar que ainda “a mídia manifesta a sua opinião regressa...”
O intuito desse artigo é propor o que a grande imprensa não vem fazendo de há muito: Explorar. Vasculhar o meio televisivo no sentido de discutir que por melhor que seja seu conteúdo é ainda a forma e os agenciamentos mediados por essa forma que dão as cartas. Esse desbravar se dá numa só noite. Que fique o exercício para os alunos dos cursos de Comunicação Social pelo Brasil espalhados. Que fique o exercício para os cidadãos que não mais apáticos somente assistem. Na terça-feira, dia 27 de fevereiro de 2007, a televisão brasileira dava uma aula sobre a relação apontada por McLuhan sem perceber. Ao mesmo tempo em que a TVE discutia com brilhantismo no seu “Observatório da imprensa”, a postura dos meios de comunicação, sobretudo o veículo impresso, diante do bárbaro assassinato do menino João Hélio, arrastado por ruas do Rio de Janeiro, a Rede Globo de Televisão exibia - com uma edição impecável - no seu Big Brother, o já famoso Paredão.
Enquanto convidados como o filósofo Renato Janine Ribeiro e a jornalista Tereza Cruvinel se empenhavam em pensar a relação entre a mídia e a violência e como pode a imprensa fazer algo para compreender as causas de tamanha crueldade, grande parte do Brasil se comovia com outra crueldade: aquela que dizem estar sendo cometida contra alguns participantes na casa do Big Brother Brasil e que serve para aliviar um pouco do sentimento de incredulidade que ainda ronda o povo brasileiro. De casa esse espectador tentava dividir sua atenção entre os dois canais e ainda dava parte de seu olho e corpo ao “Superpop” da REDETV, que exibia o imperdível debate com título parecido com “A maldição das novelas: os atores que sofrem a influência de espíritos malignos”.
No capítulo sobre a televisão do mesmo livro citado no início dessas linhas McLuhan dá a mensagem para explorar essa questão: “Acima de tudo a Tv é um meio que exige repostas criativas e participantes”. Cabe ao mesmo público que McLuhan menciona colocar o Big Brother no paredão? Será essa a alternativa? Que seja, sem problema. Mas não é única. Como meio e mensagem dialogam em uníssono, cabe ao público ainda um espasmo em nome de um meio que lhe interesse mais, já que pelo conteúdo belos programas como o da TVE aqui mencionado parecem cada vez mais relegados a um público muito específico e preteridos pelo “que o público deseja”. Unidos pela artimanha da indústria cultural precisamos cada vez mais reler McLuhan para entender o matrimônio entre meio e mensagem. Até que o Youtube os separe e possamos observar o que um outro meio pode fazer. Atento a televisão, McLuhan profetizava e rede mundial de computadores. A rede é a mensagem. Atentos ao Grande irmão - Globo ou qualquer outro produto da tv comercial brasileira - e a sua extensão impressa - Veja ou qualquer outro produto da mídia "pseudoindignada" - repensar os meios é tarefa de quem estuda os meios.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Cotidiano


O mundo é tão cotidiano.
A nicotina tem destes efeitos
Ficar a imaginar palavras perfeitas pra falar.
É muita Pressão.
Porque tudo é informação

O controle da vida não é o remoto.
O remoto da vida não é ter controle.

Quem quer pensar.
Pensar em algo para não se falar.


Então nada é cotidiano
As nossas vidas são só defeitos
Ficar a imaginar acordes perfeitos pra tocar
Na maior tensão
E graças à ARTE eu vivo paixão

A pintura da vida não é abstrata
O abstrato da vida não é uma pintura

Vamos borrar
o quadro, a tela de tanto tentar


É tudo. É nada. É cotidiano
Esquecer e lembrar de todos os feitos
Os dias são agitados, parados, perfeitos pra sonhar
Sem muita noção
Somos todos bobos da corte da população.

O crime da vida não foi tão perfeito
O perfeito da vida é mais que um crime

Pra querer tratar
cada pedaço em todo o espaço
como um traço, um laço pra nos amarrar.


Letra em parceria com Mau Abrahão

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Cidades visíveis...





"A cidade é redundante: repete-se para fixar alguma coisa na mente.
A memória é redundante: repete os símbolos para que a cidade comece a existir".



Ítalo Calvino, As cidades invisíveis

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

ARCÁDIA

Cercado em grades
Medo ao caminhar
Vejo nessa gente
Um pranto a rolar
Da cidade fujo
Tento me esquivar
Dos golpes dos mundo
Do sofrer penar

Pra loucura corro
Sem nem mais pesar
Penso, existo,
Lembro de um lugar

Um lugar pra aproveitar
Um lugar pra aproveitar

Pra loucura corro
Sem nem mais pesar
Penso, existo,
Lembro de um lugar

Um lugar pra aproveitar

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Música de imagens

Cada vez mais volto a me interessar pelos videoclipes. Não sei se por ter orientado no semestre passado um trabalho sobre o Michel Gondry, não sei se por ter voltado a assistir muitos vídeos. Talvez pelo desejo da realização dos vídeos prometidos ao Rizoma (que esse ano sai). Ontem pela manhã em meio a folia, consegui parar para começar a ler "Na Multidão", novo do Garcia-Roza. Espinoza, persoangem principal - inspirado no filósofo - é mais que um delegado investigativo. Espinosa é vídeo. Rápido, direto, iconográfico. Bem, mas não é dessa leitura que pretendo rapidamente traçar algumas linhas (ela fica pro término do livro, que aliás, pra variar, começou muito bem).
Zapeando a MTV, mais uma vez 0 Gondry. Desssa vez o maravilhoso "Let forever be", dos Chemical Brothers. (http://www.youtube.com/watch?v=Hmpxsk3dHaA). Cheio de imagens de imagens, o clipe com fortes elementos da vídeoarte, sabe como explorar a bateria nota 10 que marca a música. Michel Gondry é músico. Pega as linhas melódicas, as frases, o ritmo e a harmona, e as lê com imagens. Anamorfoses, planos abstratos e muita inspiração.

A noite, depois de 4 escolas desfilando sem nenhuma vocação videoclíptica, lembro de 'Romance Sentimentale' ( Sergei Eisenstein e Grigori Alexandrov, 1930). Deixo o carnaval e parto para a música de imagens. Traduzido como Sonata da primavera, esse curta é tido como um dos primeiros videoclipes. Alternando imagens profundamente sensoriais ( de uma natureza carnavalescamente viva) e uma mulher ao piano ( interpretada por Mara Griy), o curta-clipe do gênio russo é cinema que cumpre sua vocação. Ter como conteúdo a música. Ou se preferirem, como Bressane captou: " O cinema é a música da luz".

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

CARTA ABERTA A JOHN ASHBERY

"A memória é uma ilha de edição - um qualquer

passante diz, em um estilo nonchalant,

e imediatamente apaga a tecla e também

o sentido do que queria dizer.


Esgotado o eu, resta o espanto do mundo não ser

levado junto de roldão.

Onde e como armazenar a cor de cada instante?

Que traço reter da translúcida aurora?

Incinerar o lenho seco das amizades esturricadas?

O perfume, acaso, daquela rosa desbotada?




A vida não é uma tela e jamais adquire

o significado estrito

que se deseja imprimir nela.

Tampouco é uma estória em que cada minúcia

encerra uma moral.

Ela é recheada de locais de desova, presuntos,

liquidações, queimas de arquivos,divisões de capturas,

apagamentos de trechos, sumiços de originais,

grupos de extermínios e fotogramas estourados.

Que importa se as cinzas restam frias

ou se ainda ardem quentes

se não é selecionada urna alguma adequada,

seja grega seja bárbara,

para depositá-las?




Antes que o amanhã desabe aqui,

ainda hoje será esquecido

o que traz a marca d'água d'hoje



Hienas aguardam na tocaia da moita enquanto

os cães de fila do tempo fazem um arquipélago

de fiapos do terno da memória.

Ilhotas. Imagens em farrapos dos dias findos.

Numerosas crateras ozonais.

Os laços de família tornados lapsos.

Oco e cárie e cava e prótese,

assim o mundo vai parindo o defunto

de sua sinopse.

Sem nenhuma explosão final.




Nulla dies sine linea. Nenhum dia sem um traço.

Um, sem nome e com vontade aguada,

ergue este lema como uma barragem anti-entropia.




E os dias sucedem-se e é firmada a intenção

de transmudar todo veneno e ferrugem

em pedaço do paraíso. Ou vice-versa.

Ao prazer do bel-prazer,

como quem aperta um botão da mesa

de uma ilha de edição

e um deus irrompe afinal para resgatar o humano fardo."

Waly Salomão

As lembranças eternas de um brilho que não mente


“Benditos os esquecidos, pois desfrutam até dos próprios erros”. É com essa citação de Nietzsche que a personagem Mary, vivida por Kirsten Dunst, refere-se a memória que vai sendo apagada dos personagens centrais de Brilho eterno de uma mente sem lembranças . Esse texto é um erro, talvez.

Em um filme onde uma história de amor, técnica, psique e criatividade se confundem, lembrá-lo uma vez mais é necessário. A relação do filme com autores como Nietzsche, Freud e Bergson é não só a tônica desse artigo sem muitas memórias, mas caminho para não esquecê-lo. Não é devido a quantidade de livros recentes relacionando a filosofia ao cinema que tentamos aqui compreender a e-ter-ni-da-de de ‘Brilho’. Talvez a reboque da questão de um outro filósofo - esse com os dois pés fincados sobre o cinema - possamos dar entrada no que propomos. Um dia a pergunta o que é o cinema será reformulada, advertia Gilles Deleuze nas considerações finais de sua segunda obra sobre a arte cinematográfica, ‘A imagem-tempo’. Em suma perguntar o que é o cinema será perguntar o que é o pensamento, percebe Gilles Deleuze.

Delueze nos liga ao filósofo citado no filme. Friedrich Nietzsche é um dos primeiros pensadores a perguntar sobre outros mecanismos para se pensar o pensamento. De Nietzsche, que pouco ouviu falar do cinema, ficamos aqui com um breve recorte da memória em tom sempre aforismático. “Fui eu que fiz diz minha memória. Não posso ter feito isso, diz o meu orgulho, e mantém-se irredutível. No final é a memória que cede” (NIETSZCHE, 2002). Essa observação nos facilita na compreensão de um todo que paira sobre o filme. No mesmo sentido da citação que aparece abrindo esse texto ( e que constitui uma da mais belas seqüências do filme) a memória é um fantasma entre o tolo e o orgulho. Essa observação do filósofo do Eterno Retorno é crucial nessa análise sobre a memória no filme. Querido Waly, realmente “a memória é uma ilha de edição”. Frase a qual o cinema deve agradecer todos os dias. Todas as horas em que o pensamento é cortado pelas imagens em movimento, pelo movimento das imagens-memória.

Por esse viés da memória e com a retomada dos estudos na Comunicação da leitura de Henri Bergson, ‘Brilho eterno’ é mais que atual. O entendimento que propõe Bergson acerca da imagem em ‘Matéria e memória’ reduz a um “entre” o destino manifesto da imagem cinematográfica. Coloca o autor

A matéria, para nós, é um conjunto de “imagens”. E por “imagem” entendemos uma certa existência que á mais do qua aquilo que o idealista chama uma representação, porém menos do que aquilo que o realista chama coisa – uma existência situada entre a “coisa” e a “representação” (BERGSON, 1999).


O ‘entre-roteiro’ de Charlie Kaufman (Quero ser John Malkovich, Adaptação, Confissões de uma mente perigosa, A natureza quase humana) é um dos melhores dos últimos tempos, não por sua narrativa não linear, não por sua poesia, mas por sua preocupação amorosa de fazer do relacionamento humano uma ponte entre esse conjunto de imagens. Não à toa as imagens remetem a escombros como o amor. A memória no filme é algo que desmorona. Matéria que solapa idéia e representação. Por que Clementine Kruczynski (Kate Winslet) resolve tirar o companheiro Joel Barish (Jim Carey) da memória é importante questão que fica escondida com a entrada em cena de sua resposta: “Bem aventurados os esquecidos”.... Errar, como canta Cristiano Lyra da banda Rizoma, é acertar. (Perdoem as minhas lembranças na hora de compor essa lembrança). É assim que ao receber um cartão dizendo que foi apagado da memória Joel decide fazer o mesmo e esquecer para sempre Clementine. Matéria e memória são elementos centrais desse apagamento. Fotos e desenhos dividem com canecas e coleiras de cachorro espaço para trucidar a memória. A narrativa do filme transpõe uma ordem puramente semiótica da vida. Ordem a qual o cinema sempre quis ser devedor.

Como propõe Freud: “Bastar-nos-á, pois, saber o lugar no qual encontrar a recordação assim fixada para podê-la reproduzir”, o filme tenta encarar esse fantasma chamado memória. Comparando-a com o chamado “bloco maravilhoso” – um brinquedo antigo que retinha o desenho e depois com um simples movimento da folha que o protegia apagava o que tinha sido desenhado – Freud não fazia idéia do que a criatividade de um roteirista e a sensatez da direção de Michel Gondry podem fazer a mente e ao coração de quem assiste a esse belo filme. Mas fazia, e muito, idéia de que a memória é algo de fantasmagórico. As personagens do filme transpõem uma visão psicanalítica de mundo. Visão que o cinema sempre quis ser devedor.
Entre erros, fantasmas e gênios Brilho eterno de uma mente sem lembranças nos coloca em um labirinto das memórias. Mas de nossas memórias. Dela vem a referência a um autor despercebido. Benoist nos ajuda com a tarefa mais difícil que tem um texto, seu fim.

Em suma, nada pode ser por nós compreendido que não evoque uma de nossas recordações. Nada podemos reconhecer sem antes conseguirmos aproximá-lo de um precedente conservado na memória. Os pensadores de todos os tempos repetiram-no incessantemente (BENOIST, 1975)

Uma última recordação: O trem saiu da estação de Ciotat para a estação de Montauk...A Cine-Memória do mundo é uma vida de trens, recordações e pensadores.

REFERÊNCIAS

Benoist, Luc. Signos, símbolos e mitos. Lisboa: Edições 70, 1975.

Bergson, Henri. Matéria e memória. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

Deleuze, Gilles. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 1995.

Nietzsche, Friedrich. Para além do bem e do mal. São Paulo: Martin Claret, 2002.

Freud, Sigmund. O bloco mágico. Buenos Aires: Amorrortu, 1925.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

FARSAS, FILMES E SETAS QUE DOBRAM



Como todas as farsas enrolo teu cabelo
Beijo teu cotovelo
O que queres de mim é me prender
Não me deixar te esquecer

Mas o que quero de ti já ficou pra trás
E essa noite não me fez o bem
Que há tanto tempo faz
Me refaz, te refiz

Eu sigo um caminho torto
A sua seta não me seduz
A reta me deixa preso a sua cruz
É a dobra que me mantém.

Como todos os filmes troca-se o rolo
O ator se faz de bobo
O que fazer se a platéia perceber
(o que não fazer)

Mas a continuísta entra em cena
Me leva pra outro lugar
Bem mais minha cara
Ao anoitecer, leveza do ser
Juliete Binoche ao amanhecer

Longe de ti
Perto de mim
Perto do fim
Longe de Quem?

Longe de mim
Perto de ti
Longe do fim.
Perto de Alguém.